Foto: Bira Carvalho/Imagens do Povo, Mostra: Olhares da Favela
Palavras…pedras…duras palavras que mais parecem pedras e que ecoam dos lugares mais distantes, lá da favela, como um grito ensurdecedor, sem ligar para regras gramaticais, a poesia da periferia transforma as letras em desabafo, em poesia e recriam um estilo: a literatura marginal.
“É um tapa na cara do sistema”, afirma o escritor Alessandro Buzo, 34 anos ao se referir ao estilo de escrita dos poetas do gueto.
O escritor, que teve seu primeiro contato com a cultura hip hop desde que esta chegou ao Brasil, há mais de 20 anos é autor de quatro livros independentes no país. O primeiro deles é intitulado O Trem – Baseado em fatos reais. O segundo livro traz o nome que Buzo usa na sua marca e no blog no qual relata seu cotidiano e as indignações contra o sistema: Suburbano Convicto – O Cotidiano do Itaim Paulista.
Em 2005, Buzo lançou o terceiro livro, chamado O Trem – Contestando a versão oficial e por último, no passado, Guerreira, o primeiro romance de uma série de fatos reais.
Quando questionado sobre a maior dificuldade em ser um escritor marginal, Buzo afirma: “Minha maior luta é conseguir vender os livros de mão em mão, de mano em mano”.
No entanto, ele conta que feliz que o livro Guerreira será relançado no meio desde ano por uma editora grande, com distribuição nacional nas livrarias.
Fora os trabalhos independentes da literatura, Buzo participou de coletâneas como Rastilho de Pólvora – Antologia poética do Sarau da Cooperifa e Literatura Marginal – Talentos da escrita periferia, organizado por Ferréz.
Informação é fundamental
“Hoje, 90% do que eu ouço em casa é rap nacional, desde que me envolvi mais com a cultura, passei a promover eventos, vender shows de grupo, só depois de pesquisar e me informar sobre o movimento através de jornais e revistas é que eu virei escritor”, conta Buzo, lembrando que a boa informação dentro do hip hop é fundamental.
Ao referir-se ao real significado da cultura, o escritor, que dedica-se a vários eventos e projetos sociais afirma que a palavra que lhe vem primeiro a mente é atitude. “Quem é do hip hop não fica rebolando a jaca nem ouvindo modinhas, são jovens mais instruídos”, afirma.
Dentre os trabalhos atrelados ao hip hop, Buzo conta que promove o evento Favela Toma Conta, que já teve 11 edições, onde grupos de rap, famosos da cena paulistana como o extinto RZO, De Menos Crime, Thaíde, DMN, Expressão Ativa, Tribunal MC’s, Cabal entre outros. “Geralmente são festas na favela, sem cobrar ingressos. O objetivo é promover o entretenimento para a periferia”, diz.
Através do conhecimento, o 5º elemento do hip hop, incorporado na cultura posteriormente, pela Universal Zulu Nation, Buzo montou uma biblioteca comunitária no bairro onde mora, afim de levar informação e entretenimento através da literatura para as crianças e jovens carentes do Itaim Paulista, zona leste da cidade de São Paulo, onde vivem 320 mil habitantes.
“Pelo 5º elemento eu também participo como colaborador de vários sites e blogs ligados ao hip hop e atuo também como repórter colaborador para a revista Rap Brasil. Tento ajudar de várias formas”, conta.
E no dia-a-dia…
“Meus contos são ficção, mas sempre relatam histórias que poderia ter acontecido. Vejo acontecer parecido na minha quebrada”, informa Buzo, quando questionado a respeito de como é a literatura marginal que ele produz e diz ainda: “Me baseio no meu cotidiano, passo para o papel as dificuldades do dia-a-dia”.
Para o escritor, a literatura marginal assusta o sistema, porque segundo ele: “ A elite pensava que não sabíamos nem ler e agora estamos escrevendo livros. Só tem conhecimento quem pisa no barro, quem sobe e desce o morro, quem atravessa suas vielas. Acho que a literatura marginal é importante, porque a cena está forte e não é só modinha”.
Buzo, atualmente, tem uma rotina tranqüila, um pouco diferente até do que da maioria dos moradores do Itaim Paulista.
“Acordo cedo, passo a manhã com minha esposa e meu filho de sete anos, pois gosto de tomar café em casa, tranqüilamente com eles. Depois eu vou trabalhar na DGT Filmes, uma produtora de vídeos, onde faço o horário de 12h às 19h. No meio tempo, escrevo minhas colunas, atualizo meus blogs e faço palestras e oficinas. Assim é o meu dia-a-dia”, relata o autor, que diz adorar música, cinema e leitura, mas: “detesto orkut, programas de fofoca, novelas, reality shows, falsidade e gente que só reclama”, desabafa.
Dos problemas e soluções
“A elite precisa entender que não dá para se morar num palácio ao lado de uma favela, então, é utopia acreditar no fim da desigualdade social”, afirma Buzo, convicto. O escritor não vê o fim da desigualdade social no Brasil, alegando que ela sempre existiu, mas acredita numa redução. “Precisamos de programas de distribuição de renda, de empregos com melhores salários”, reivindica.
Durante a entrevista, Buzo é questionado sobre a notícia publicada pelo jornal Folha de São Paulo onde dizia que mendigos da Praça da Sé serão retirados do local durante a visita do Papa Bento XVI ao Brasil e afirma: “Acho que deveriam tirar os mendigos não só da Praça da Sé, mas de todo o Brasil e levá-los para lugares limpos, onde eles possam retomar suas vidas e não só tirar porque o Papa vem, porque o Bush vem e depois devolvê-los para as ruas, sem nenhuma perspectiva de vida”, reflete.
Para ele, a saída dos problemas sociais seria mais estudo e leitura. “O povo tem que parar de se alienar através da TV e ler mais, o hip hop é uma porta para isso, pois é uma cultura que vive constantemente em movimento. É a cultura dos favelados e não vão tomar o hip hop da gente, ele é nosso”, diz.
Planos para o futuro
Sem nunca parar, o escritor está abrindo uma loja, Suburbano Convicto, e diz que terá mais um “corre” no cotidiano, além de estar se dedicando a um novo livro, com o título provisório de Profissão MC e um outro, já praticamente pronto: Do conto à poesia.
Tudo isso sem deixar de lado as palestras e oficinas sócias, sempre disseminando a cultura hip hop na cidade de São Paulo e em todo país.
Ao deixar uma mensagem Buzo é direto: “Desligue a TV e leia um livro.