Que há insatisfações no país por causa da ascensão da população quilombola à condição de
sujeito de direito, sobretudo do direito à terra, disso ninguém duvida. Até porque alguns
grupos políticos e econômicos têm se posicionado publicamente, como o Partido Democratas
(ex-PFL) ou a Aracruz Celulose, esta última fazendo abertamente uma campanha de
criminalização dessa população. Até aí há de se entender, pois se trata de interesses
conflitantes: reparar e promover o direito legítimo da população quilombola às suas
terras põe em risco a histórica trajetória de manutenção do latifúndio nas mãos da
pequena elite agrária brasileira.
O que não dá para admitir é que uma emissora de televisão – que é uma concessionária
pública do sistema de radiodifusão – use de técnicas de produção jornalística para
criminalizar comunidades quilombolas, sem explicitar às pessoas que estão assistindo a
sua “posição” em relação ao tema. Foi o que aconteceu na edição de 14 de maio último do
Jornal Nacional, quando a matéria suspeitas de fraude em área que vai ser reconhecida
como quilombola foi ao ar.
Não é a primeira vez que a Rede Globo faz manobras em suas edições. A novidade é o
“alvo”. Para as pessoas mais desavisadas, ao assistir a matéria sobre São Francisco do
Paraguaçu, no Recôncavo Baiano, a impressão que passa é que uma quadrilha de criminosos,
que se autodefinem como quilombolas, irá se apoderar indevidamente das terras dos pobres
fazendeiros e irá destruir os remanescentes de Mata Atlântica existentes no local.
Sem contextualizar, a matéria em nenhum momento abriu espaço para as pessoas que se
reconhecem quilombolas naquela comunidade afirmarem as razões pelas quais reivindicam o
reconhecimento oficial de sua condição étnica.
*Diante do fato, o Centro de Cultura Luiz Freire vem a público manifestar seu repúdio à
Rede Globo e solidarizar-se com o movimento quilombola e com a comunidade de São
Francisco do Paraguaçu.
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