Fotos: Vanessa Silva
Viver como alvo de racismo conjugado com machismo e pobreza: essa tríplice condição quase exclusiva da mulher afrodescendente no Brasil faz dela uma combatente em terrenos que nem sempre se intercruzam de forma tranquila.
Suely Carneiro participou do Encontro Pan-Amazônico entre 14 e 17 de julho, em Belém, onde falou da desumanização e coisificação das mulheres negras, perpetuadas através da literatura, da erotização da relação entre o colonizador e a escrava. ” A ficção criou o mito da mulher negra lasciva”, apontou. E isso agravou sua condição como alvo de violência sexista e doméstica até os dias de hoje.
O machismo que promove “a apropriação sexual das mulheres pelo próprio grupo dominado é a humilhação total”, diz Suely
Ela cita dados do aliciamento de crianças e jovens pelo tráfico sexual, em que 60% são meninas negras ou mulatas entre 13 e 16 anos de idade, muito pobres e vítimas de violência doméstica. “Mesmo prevendo risco que vão correr, muitas aceitam porque o que quer que vier não pode ser pior do que elas já conhecem”. A escolha para muitas está em virar puta na Suiça ou ser explorada em casa de família e ter de fazer sexo de graça com o patrão.
Em um país de maioria negra, em que “seres humanos são tratados como menos humanos que os outros”, Suely acha que o racismo está presente nas demais lutas sociais através do silêncio.
Desde os anos 80 as mulheres negras vem tentando quebrar esse silêncio, enfrentando uma tríplice discriminação, de classe, gênero e raça. Além do combate à pobreza, passaram a lutar contra a dificuldade do movimento negro para lidar com a questão de gênero e para não serem invisibilizadas por serem mulheres. E de outro lado, também tiveram de passar a lutar para que as conquistas feministas não contemplassem apenas as mulheres brancas.
Coube assim às negras a luta para consensuar bandeiras entre movimento negro, de mulheres e pela superação das desiguladades de classe.
A Plataforma feminista gestada em 2002 em Brasília, na Conferencia Nacional de Políticas das Mulheres, foi o coroamento, segundo ela, de quase duas décadas dessa luta pela solidariedade entre feministas e mulheres negras para superar desigualdades
Faz parte dessa nova identidade política a luta para enegrecer a agenda do movimento feminista brasileiro, imprimir o peso da questão racial nas políticas públicas – lembrando que a maioria das mulheres pobres, alvo de políticas de controle demográfico, são negras. Igualmente Suely enfatiza a luta da mulher no movimento negro para acabar com o mito da democracia racial, sobre a qual se baseia a visão de democracia que as populações brancas construiram no Brasil.
Defensora de uma radicalização do projeto democrático, Suey propôs um novo pacto de gênero e um novo pacto racial, em oposição ao pactos hegemônicos raciais e sensuais que oprimem particularmente as negras brasileiras.
Essa radicalidade também precisa ocorrer no pensamento de esquerda que, lembrou ela, minimiza a questão racial na luta de classes para conquista dos direitos humanos, justiça social e a democracia.
Leia Cobertura completa do Encontro Pan-Amazônico de 14 a 17 de Julho de 2009