Cada dia mais populares, os chamados blogs progressistas já disputam leitores e credibilidade com jornais e sites tradicionais. Fácil e barata de fazer, ágil e garantindo interatividade com seu público, a novidade, que floresceu no Brasil especialmente nos últimos quatro anos, já mereceu até um encontro nacional. O evento aconteceu em São Paulo, nos dias 21 e 22 de agosto, na sede do Sindicato dos Engenheiros, e teve mais de 300 participantes oriundos de 19 estados. Para um dos organizadores, o jornalista Rodrigo Vianna, que mantém desde 2008 no ar o Escrevinhador, trata-se de um fenômeno que rompe com o antigo paradigma da comunicação, em que havia um emissor e um receptor passivo. Atuando na imprensa tradicional desde 1989 e ainda hoje trabalhando como repórter da TV Record, ele afirma: são dois mundos completamente diferentes.
O que é esse fenômeno dos blogs, hoje muito populares no Brasil?
Primeiro, é um sinal de que a velha mídia não está dando conta da comunicação no Brasil. Há milhares de pessoas que não se sentem incluídas no sistema tradicional de produção da comunicação, inclusive muitos jornalistas, gente que não se sente livre para fazer o seu trabalho da melhor maneira possível. Em segundo lugar, é um resultado dos avanços tecnológicos. É baratíssimo fazer um blog. Na época da ditadura, quando a imprensa ficou censurada, surgiram os jornais alternativos, mas era necessário ter uma gráfica, comprar papel etc.. Durante o encontro de blogueiros, um colega deu o exemplo: faz-se um blog básico com R$ 100,00. Um mais trabalhado, com vídeo, rádio, imagem, custa R$ 5 mil. Com um computador, uma câmera e um microfone, cria-se algo que é uma minitelevisão ou minirrádio. A Internet, no limite, propicia que cada um seja um emissor da comunicação. Antigamente, havia o emissor, o dono da informação, e o público passivo, o receptor. A Internet quebra esse princípio, permite que as pessoas trabalhem em rede, então quem é leitor também produz a notícia, deixa de haver uma hierarquia tão forte. Por isso, os blogs crescem tanto, já fazendo um contraponto à imprensa escrita.
Como aconteceu esse despertar?
Esse fenômeno é mundial, nos Estados Unidos é muito forte. Há blogueiros como a Arianna Huffington, que criou um blog e aos poucos o transformou num site de notícias, que se chama Huffington Post. No Brasil, isso engrossou muito de quatro anos para cá, porque a velha mídia assumiu uma posição muito unilateral na cobertura política, vendendo a imagem de neutralidade, quando todo o mundo percebe que ela toma partido. Assim, os blogs crescem, bem como o número de leitores. Por isso, conseguimos trazer 300 pessoas a São Paulo para discutir esse movimento que é forte no Brasil inteiro.
Por que você se tornou blogueiro?
Eu fiquei pessoalmente traumatizado pelo episódio da eleição de 2006 e a cobertura feita pela TV Globo, da qual não gostei. Acabei saindo, ou melhor fui saído, da Globo por isso. Eu me senti tolhido como jornalista, não podia discordar. Por óbvio, quando fui trabalhar na imprensa sabia que era assim, mas isso tem limites, você acha que dá para ir negociando essas diferenças com quem te contrata. Nos últimos anos no Brasil, o espaço para essa negociação foi diminuindo muito, criou-se um pensamento único e você tinha que seguir a cartilha do dono da empresa, sem espaço para dissenso, tanto que os colunistas, os comentarias, todo mundo diz a mesma coisa. As opiniões são muito parecidas. Então, onde seria possível expressar a minha visão de mundo? Na Internet, com essa ferramenta que estava à disposição
Muitos blogueiros não são jornalistas profissionais, o que faz com que se levantem dúvidas quanto à qualidade da informação que produzem. Qual a sua opinião sobre isso?
O Estado de S.Paulo fez até uma publicidade, que era um macaco diante de um computador como se fosse um blogueiro. Eles acabaram tirando isso do ar porque pegou mal, mas jogavam com essa dúvida. Aos poucos, ganha-se credibilidade. Se você dá uma informação que se confirma, vai conquistando isso. Vou dar um exemplo. A Folha de S. Paulo e o UOL fizeram um debate com os candidatos a presidente no qual os internautas podiam fazer perguntas. Um blog descobriu que um desses era um funcionário do PSDB, o que não impedia sua participação, mas exigia sua identificação. Os leitores puderam confirmar que a denúncia era verídica. E o blog tem essa riqueza: dá a informação e os links para que o leitor possa percorrer o restante da cadeia informativa e se aprofundar sobre o assunto. Por outro lado, os processos de comunicação são sujeitos a erros e manipulação, não só nos blogs. O leitor precisa desconfiar do que lê, o senso crítico deve estar sempre presente. O público do blog é treinado a isso porque interage, rebate, critica. Muitas vezes você escreve um texto e o comentário passa a ser tão importante quanto. A gente costuma dizer que na Internet a informação é o texto do blogueiro mais os comentários, que o complementam ou até o contradizem.
Esse leitor é mais qualificado que o da mídia tradicional?
Ele é mais ativo. A velha mídia criou um nicho de leitores que repetem o que leem sem nenhum senso crítico.
Como as redes sociais entram nessa história?
Todo mundo que faz blog está atento a essas redes, facebook, orkut, twitter, que são disseminadores da informação que rola pela Internet. O interessante é que não é o jornalista ou o dono do veículo dizendo a um público que ele não conhece “trago-vos a verdade”. As pessoas têm 200, 300 contatos cadastrados quando chegam a isso, então a credibilidade é grande, porque é o seu amigo dizendo “isso aqui é interessante”. Ainda não foi estudado direito, mas é um fenômeno que quebra totalmente o paradigma da comunicação de cima para baixo.
Juntamente com toda essa circulação livre da informação, há conteúdos até criminosos na Internet, que incentivam o racismo e a violência. Como regular isso sem censurar?
Quem abusa pode ser responsabilizado. Antes, havia os panfletos apócrifos. Na Internet, é até mais fácil rastrear de onde partiu a ofensa. De toda forma, esse é um lado obscuro para o qual é preciso ficar atento.
Foto: Beatriz Arruda
Blogueiros dominam a cena
Rodrigo Vianna deu uma bela entrevista para meu livro “A Imprensa x Lula – golpe ou ‘sangramento’?”, que estarei lançando neste sábado, dia 2, à partir das 17:00 horas, na Saraiva Mega Store do Shopping RECIFE, Boa Viagem.
Convido a todos os parceiros na mesma luta para este modesto evento.