A manifestação anti-homofobia convocada em São Paulo, em protesto contra a agressão sofrida por André Baliera na semana passada, reuniu mais de cem pessoas na esquina onde o crime aconteceu: Henrique Schaumann X Teodoro Sampaio. Durante toda a tarde do sábado, dia 8, a família do rapaz agredido, além dele próprio, juntaram-se a amigos e conhecidos militantes da causa em São Paulo, erguendo cartazes e faixas a cada farol vermelho e provocando espontâneos buzinaços dos motoristas em apoio.
É o direito de existir não apenas como consumidor. É o direito de seres humanos serem o que são, sem acompanhar a moral hipócrita decretada pelo mercado. Heterossexuais também participaram do protesto, onde cada um escolhia seu cartaz entre os prontos, ou fazia um novo, e ia caminhar entre os carros no farol fechado, trocando de rua a seguir.
André Baliera, estudante de direito de 27 anos, foi espancado nessa mesma esquina, na noite da outra segunda-feira, dia 3 de dezembro, por Bruno Portieri e Diego Mosca, dois fisiculturistas enormes, bastante diferentes do tipo físico do jovem, diversidade que deveria ser respeitada. Os dois estão presos por tentativa de homicídio e lesões corporais, e tentam desmentir o motivo torpe do crime, depois de terem dito frases claramente homofóbicas, testemunhadas por três pessoas, que decidiram apoiar em juízo o agredido, coisa também não muito comum. Com apoio da família, André foi para as redes sociais denunciar o crime, que acontece todos os dias nesta cidade, sobretudo na periferia, sem gerar revolta. “Só existe esta mobilização e apoio porque foi numa região nobre da cidade”, disse o estudante, com o que concordaram militantes.
Homofobia deve ser criminalizada e não os LGBTs
Os crimes de homofobia aumentam no país, enquanto o projeto de lei que criminaliza este preconceito (PL 122) continua bloqueado no Congresso brasileiro. Levantamento feito durante a Parada Gay de São Paulo em 2005 mostrou que 72% dos entrevistados foram alvo de discriminação e 65% sofreram algum tipo de agressão física ou verbal. Pesquisas realizadas pelo Grupo Gay da Bahia apenas em relação aos crimes registrados (sabemos que ficam muitos sem registro ou sem a verdadeira causa), mostram a evolução da homofobia: 2007 – 122 assassinatos de gays; 2008 – 189; 2009 – 200; 2010 – 260; 2011 – 278; só no primeiro semestre de 2012 – 165. “Hoje a gente tem coragem de denunciar”, disse André Fischer durante a manifestação. “ Antes a gente ia para casa, ficava uma
semana chorando, dizia que tinha sido outra coisa, um assalto. Não tem mais nem menos casos do que tinha alguns anos atrás”, opina o militante.
Todos concordam com a importância de aprovação do PL 122, que transforma a homofobia em crime, a exemplo do que ocorre com o racismo. Pena que entre os congressistas brasileiros pouquíssimos pensem assim. Entre eles, Jean Wyllys (PSol-RJ), que denunciou na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA (Organização de Estados Americanos), o assassinato do jornalista Lucas Fortuna, outro recente crime por homofobia, este em Pernambuco. Com 28 anos, Lucas era jornalista e militante da causa LGBT, portanto muito conhecido no Brasil, embora morasse em Mato Grosso do Sul. Lucas presidia o diretório municipal do PT em Santo Antonio de Goiás; estava em Pernambuco participando de um campeonato de vôlei, como árbitro, área na qual chegou a receber prêmios pelo desempenho.
“O assassinato de Lucas engrossa as estatísticas que colocam o Brasil no topo da lista dos países com o maior número de crimes de ódio ao redor do mundo”, diz Jean Wyllys em nota divulgada na semana passada. O corpo de Lucas foi encontrado no domingo (18), na praia de Gaibu, Cabo de Santo Agostinho, a poucos quilômetros de Recife. O laudo do IML registra as marcas de espancamento e facadas, mas diz que a morte foi causada por afogamento. Wyllys participou na segunda (19) de painel internacional sobre experiências de participação política de pessoas LGBT na América Latina, atividade promovida pela CIDH/OEA que reúne políticos LGBT eleitos pela população. Foi durante a reunião da Comissão, em Bogotá, Colombia, que o deputado brasileiro anunciou que levaria o caso até a corte internacional, que logo a acatou.
O caso de Lucas Fortuna será crime acompanhado pela Unidade para os Direitos das Pessoas LGBTs da OEA. “O código penal brasileiro pune crimes contra a vida”, continua a nota divulgada pelo deputado, “e qualquer crime contra a vida já é um crime hediondo, ainda mais quando por motivo torpe. As circunstâncias dessa ocorrência – que indicam que ao fim e ao cabo a motivação foi homofóbica – não podem ser menosprezadas ou ignoradas pelo delegado ou delegada responsável pelas investigações, pois determinará o rumo das mesmas”.