As leis são para todos?
Enquanto George W. Bush ironicamente discursava sobre o “progresso” das forças estadunidenses no Iraque, ao visitar o país, na semana passada, de maneira secreta por “questões de segurança”, as tropas britânicas se retiravam de Al-Basra, o que para muitos especialistas significou a derrota da coalizão na principal província do Iraque. No período atual da guerra, em que as forças de ocupação iniciam os preparativos para a retirada do país, nos perguntamos se as nações ricas, como os Estados Unidos e o Reino Unido, irão um dia ser responsabilizadas pelo doloroso crime contra a nação iraquiana.
Após mais de 4 anos de ocupação, o Iraque hoje representa o mais dramático e destrutivo exemplo do que acontece quando os poderes ocidentais enviam suas máquinas de destruição pelo mundo baseando somente em seu senso de imperialismo. Depois de desmascarado o mito sobre as “armas de destruição em massa” de Saddam Hussein – o motivo pelo qual o Iraque foi invadido – o governo estadunidense passou a justificar a ocupação do Iraque pela presença da Al-Qaeda no país. O recente discurso de Bush focou exatamente nesse ponto: “Vocês estão impedindo que a Al-Qaeda use o Iraque como um lugar para planejar ataques contra os Estados Unidos”, disse ele aos soldados estadunidenses. Ironicamente, porém, foi também comprovado por diversos órgãos ocidentais (muitos deles estadunidenses) que a Al-Qaeda só chegou ao Iraque após a invasão do país. O Reino Unido, sob o comando de Tony Blair, foi a ferramenta utilizada para criar a ilusão de que o “perigo” que representava o Iraque era algo de nível mundial, e que, portanto, uma coalizão internacional era necessária para solucionar a questão. Dessa forma, os principais aliados da Guerra do Iraque fabricaram a frágil coalizão que hoje procura a porta de saída do Iraque em chamas. No entanto, serão eles responsabilizados pelos crimes cometidos?
A aliança imperialista anglo-estadunidense causou uma crise humanitária no Iraque. De acordo com a ONU, cerca de 4,2 milhões de iraquianos foram desabrigados até então, a maioria fugindo para a Síria e a Jordânia. O jornal médico britânico The Lancet realizou um estudo que alerta que “os números de 655 mil civis iraquianos mortos pela ocupação desde 2003 é subestimado”. Além disso, os líderes ocidentais somaram insultos aos danos causados, subestimando e inteligência da população mundial (com sucesso em alguns casos) ao inventar novos motivos para continuar a guerra a cada vez que outro é desmascarado. Infelizmente, para o terror dos civis iraquianos, muitos líderes ocidentais compraram a teoria de que a ocupação do Iraque era justificável pela presença da Al-Qaeda no país. Enfim, quando os superpoderes agem com impunidade – ao invadir, destruir e abandonar outras nações – a mensagem que recebemos é que fazemos parte de um jogo sem regras. Qual a conseqüência de tal realidade? Quando todos os criminosos saem impunes, ninguém tem um incentivo para agir racionalmente, nem sequer pacificamente.
Os eleitores estadunidenses não puniram Bush por causa de seus crimes de guerra e contra a humanidade no Iraque, Palestina e Afeganistão – eles simplesmente o repreenderam por ter falhado em realizar o sonho imperial de forma breve e barata. Não houve reclamações quando Bush destruiu um país inteiro. Pelo contrário, ele foi aclamado por homens e mulheres, que o enalteceram na Câmara dos Deputados. Ninguém falou sobre levá-lo a um tribunal para responder a acusações por esses crimes – tal idéia nem sequer existiu. Os estadunidenses expressaram apenas a sua frustração por não detonar iraquianos como seus ancestrais fizeram tão facilmente com a população nativa da América do Norte. Como resultado, ante a um tribunal de crimes de guerra, Bush sempre poderia afirmar, de maneira correta, que a maioria dos Estados Unidos estava com ele desde o início da guerra.
Todos que se calam perante tal injustiça têm a sua parcela de culpa no que acontece e no que virá. Assim que os bombardeios a Bagdá foram iniciados, a consciência moral do Ocidente evaporou-se – todos se calaram e simplesmente esperaram pelo que viria a seguir. Se a coalizão criminosa liderada pelos Estados Unidos conseguir entrar, destruir e abandonar o Iraque – como está sendo feito, em um completo vácuo moral movido pelos “valores ocidentais” de “progresso” – o mundo certamente sofrerá as violentas conseqüências que se seguirão, e será tarde demais para manifestações de paz e críticas de direitos humanos. Se a impunidade persistir, a popular sentença de que “violência gera violência” jamais será tão verdadeira. Se nos calarmos, o sangue dos mártires terá sido derramado em vão.
FONTE:
Jornal Oriente Médio Vivo – http://www.orientemediovivo.com.br
Edição nº73 – http://orientemediovivo.com.br/pdfs/edicao_73.pdf
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