Diante das crises pelas quais a humanidade já passou sempre foram apresentadas previsões para o futuro, algumas otimistas outras pessimistas, poucas foram confirmadas ou em parte concretizadas. Claro que existiram, também, aquelas posições que se limitaram a afirmar que nada iria mudar e que tudo continuaria como antes. Não está sendo diferente diante da crise da pandemia de Covid-19.
Assim há batalhões defendendo que, possivelmente, com a pandemia de Covid-19, o mundo econômico sofrerá um processo recessivo acentuado, o PIB (Produto Interno Bruto) tanto de países ricos quanto de países pobres vai diminuir sensivelmente, o desemprego vai aumentar, muitas empresas vão fechar, um caos generalizado invadirá todos os setores, a miséria e a fome vão aumentar de forma intensa e descontrolada, milhões de pessoas morrerão. Assim, são consideradas, pelo menos, as previsões mais pessimistas e assustadoras para o depois da pandemia de Covid-19.
É certo que o PIB dos países, a soma de todos os bens e serviços produzidos em um país, deverá sofrer alterações em 2020 como uma das consequências da pandemia de Covid-19. Porém, na sequência, já em 2021, ou talvez antes, mesmo no final de 2020, deverá novamente retornar ao crescimento em decorrência, também, da própria Covid-19. As curvas econômicas flutuam do crescimento ao decrescimento e vice-versa numa flexão contínua e, em muitas das vezes, as variações para cima ou para baixo são decorrentes das mesmas causas, haja vista que o mercado se reinventa constantemente, aprende, erra e se corrige. Além do mais, na prática, não há como uma curva econômica ser crescente ou decrescente eternamente.
É sabido, também, que a imposição de quarentenas parciais ou totais (tipo lockdown – bloqueio total) para a contenção de pandemias já atinge gravemente todos os níveis de informalidade no mercado de trabalho. Assim, aquele trabalhador que tem seus proventos diários dependendo unicamente daquilo que consegue vender no dia não conseguirá suportar a crise porque sem seus clientes não terá dinheiro algum. As famílias que dependem destes trabalhadores vão, então, ser privadas das necessidades básicas podendo até morrer de fome. Sem contar que grande quantidade desta população desassistida poderá morrer em decorrência da própria contaminação pelo coronavírus da Covid-19.
Mas, independentemente das limitações fiscais de cada país, os correspondentes governos haverão de intensificar os sistemas de proteção social para garantir a vida destas famílias mais vulneráveis. Outros programas, entretanto, deverão proteger todas as demais fontes de emprego formal. Mais modificações, então, serão necessárias. Todavia, as populações continuarão sendo minimamente atendidas.
Não bastam, porém, programas sociais para atender aos menos favorecidos. É necessário, também, seguir apoiando as diversas instituições do setor financeiro e as principais fontes de emprego que se não conseguirem enfrentar as dificuldades geradas pela crise vão quebrar não garantindo milhões de empregos formais.
Nas visões pessimistas, mais exageradas, a Covid-19 vai paralisar quase todo o consumo, criando uma recessão econômica e financeira mundial intensa em que os homens brigarão pelos restos de comida que sobrar, em que grande parte da civilização será inevitavelmente dizimada do planeta e os sobreviventes perderão as liberdades individuais sendo subjugados por poucos que deterão o poder.
Todavia, por outro lado, as previsões otimistas afirmam que nunca existiu um momento tão desafiador que permitirá, inevitavelmente, ao mundo se expandir positivamente em todas as áreas, que as economias crescerão e se reinventarão servindo-se da criatividade, da redução de custos operacionais e de baixos investimentos para solucionar os múltiplos problemas que irão surgir permitindo expansão econômica, adequação financeira e prosperidade social jamais experimentadas pela humanidade.
Na esteira dos otimistas, nunca foi tão possível reduzir custos estruturais e aumentar produtividade como meta ou prioridade das instituições nos mais diversos setores do mercado sendo grande parte destas transformações provocadas em função na mudança de comportamento que a Covid-19 já está promovendo ou vai exigir tanto dos empresários quanto dos consumidores em futuro próximo.
Nas visões positivistas tanto a oferta quanto a demanda sofrerão choques intensos que vão obrigar a descoberta de outros caminhos para a economia prosperar. Enquanto alguns setores tradicionais vão sofrer muito e poderão até desaparecer, outros muitos se fortalecerão e novos serão criados. Saliente-se, a propósito, que semelhante perspectiva já era uma realidade mesmo antes da Covid-19, pois a Indústria 4.0 ou a Quarta Revolução Industrial tem por pressuposto exatamente semelhantes transformações.
Deve-se salientar que independentemente das previsões otimistas ou pessimistas sobre o pós pandemia de Covid-19 o mundo continuará funcionando e diversos outros choques seguirão afetando (sensivelmente) a taxa de crescimento ou decrescimento econômico do mesmo mundo como, aliás, sempre ocorreu no passado seja ele próximo ou distante.
Não se deve esquecer, entretanto, que é um dilema falso (ou pelo menos questionável) esta dicotomia saúde-economia que tanto alarde se faz. Mercado ou economia não é um “ser” dissociado das pessoas. Não há economia sem pessoas e, portanto, pessoas sem saúde não podem melhor preservar a economia. A história já mostrou que as sociedades em crise que poupam a maioria da vida de seus cidadãos recuperam suas economias mais rapidamente. Mas, mesmo assim, esta não é uma regra universal, mantendo-se o dilema em aberto.
Previsões otimistas ou pessimistas sobre o que acontecerá depois de se controlar a covid-19 são apenas precárias e dependem muito mais do psicológico de quem as faz e de quem as admite. Geralmente são ditadas pelo emocional imediato e não podem ser tomadas como verdades a seguir. É certo, porém, que vivemos muitas incertezas e o campo das possibilidades se apresenta ilimitado, o que nos afeta ainda mais e intensamente frente aos julgamentos ou temperamentos.
Mas a pandemia de Covid-19 poderá promover uma lição de caráter pedagógico incrível e transformadora, porque talvez venha ensinar muito em relação à produção e ao consumo.
Talvez, apenas talvez, depois da Covid-19, as pessoas poderão perceber, por exemplo, que não é o caso de se pagar fortunas por roupas, sapatos, bolsas ou quaisquer outros adornos de grife. As mesmas pessoas haverão de entender que não é racional pagar milhões por automóveis que enferrujam ou estragam com o passar do tempo; poderão aceitar que não existem razões verdadeiras para profissionais de qualquer área receberem milhões de salários; sentirão, possivelmente, que a sociedade antes da Covid-19 era muito desigual, injusta e cruel. A sociedade terá tudo para entender que não há mais espaço para a competição entre os homens, mas sim que a cooperação entre os homens é a bola da vez. Mas, talvez, acima de tudo, os homens poderão compreender, de vez, que de nada adianta ter capital extra guardado, acumular riquezas, se não se têm o que comprar. É, o mundo poderá sofrer mudanças radicais em diversos aspectos a despeito do próprio homem.
Mas não se deve esquecer, também, que é nas crises que o melhor ou o pior do ser humano se aflora e pode ser que nem mesmo a solidariedade forçada motivada pela pandemia de Covid-19 tenha alguma continuidade e, de repente, de forma invisível, permita, novamente, a cada um voltar rapidamente para o seu quadrado de individualidade sem dar a mínima para o seu semelhante.
Deixando, entretanto, as previsões de lado, há de se pontuar que o isolamento social, a intensificação do trabalho home office, o funcionamento do mundo mesmo comandado remotamente, a instituição de bloqueios e quarentenas para conter a propagação da pandemia, dentre outras ações motivadas pela Covid-19, estão ensinando à humanidade que se nada do citado nos parágrafos precedentes acontecer mesmo assim não existirá um mundo como era antes da Covid-19.
O mundo antes da Covid-19 fará parte da história. Todavia, o novo mundo pós Covid-19 já começou mesmo antes do término da crise da Covid-19, pois neste novo mundo não é mais possível agir unicamente de forma física. O fazer exclusivamente com as próprias mãos faz parte do passado.
A principal parte do desenvolvimento da humanidade será intensificada em meio digital. Sim, a digitalização tão temida pela maioria das pessoas já é caminho sem volta e garantirá mais intensificadamente aos homens seguir muito além após a Covid-19.
A digitalização do mundo já é a nova onda, a nova realidade. A digitalização já permite resolver muito do caos que a crise da Covid-19 está promovendo e ainda vai gerar. Por intermédio da digitalização, são reduzidos enormemente os custos operacionais, acentuadamente são eliminadas inúmeras operações físicas e se aumenta a produtividade em todas as dimensões de forma jamais idealizada.
A digitalização possibilitará experimentar em mundo virtual soluções de quaisquer problemas para liberar mais espaço no mundo físico e aumentar com maior eficiência as populações de consumidores. Os CPS (Cyber-Physical Systems) começam a dominar o mundo e a dar ao homem uma nova experiência que lhe permitirá viver em uma realidade cujas soluções são obtidas e controladas remotamente.
As soluções para o mundo físico serão testadas em meio digital para somente depois serem embarcadas, implementadas, na realidade. Caberá aos CPS a troca de informações e dados, online, até que as melhores soluções sejam determinadas para somente depois encontrar aplicações nos problemas do mundo real. A Internet das Coisas ou IoT (Internet of Things) passa a controlar tudo que pode ser acessado e controlado remotamente, permitindo a atuação na realidade física. Esta nova concepção do engendrar, do “engenheirar”, da Engenheira, é que está mudando o mundo.
Diminuindo, em consequência, o número de pessoas agindo no meio físico, ocorrerá redução da poluição, haverá menos emissão de gás tóxicos, se obrigará a racionalidade no consumo, a produção será mais sustentável; com a melhoria do ar, ecossistemas serão regenerados, além de uma infinidade de outros benefícios advirão para uma vida melhor no planeta.
Porém, é interessante salientar que há uma certa insistência em se falar em se voltar à normalidade após encontrar-se uma solução para a pandemia de Covid-19, se preocupando, em demasia, com o tempo que se levará para aquela volta à normalidade. Mas, felizmente, jamais se voltará ao mundo antes da Covid-19. A digitalização não permitirá.
Pode-se dizer que a digitalização constitui motor de desenvolvimento do mundo atual e seus diversos benefícios são gerados no dia a dia da civilização promovendo transformações todos os dias. A digitalização é a porta ou o caminho que leva à Quarta Revolução Industrial (ou Indústria 4.0) que começamos a viver a partir de 2011 na Feira de Hanover durante o lançamento de um programa do governo alemão para aumentar a competitividade das empresas alemãs.
No mundo 4.0, viabilizado pela tecnologia digital, pela digitalização, pelo uso da Internet e dos CPS, estabelece-se uma ampla conectividade entre equipamentos entre si e com as pessoas quando dados ou informações são enviados ou recebidos sendo o controle a distância dos processos e a descentralização do controle uma das importantes possibilidades geradas.
A digitalização é, efetivamente, o primeiro e decisivo passo no início do caminho para se alcançar a Quarta Revolução Industrial e todos os benefícios, não somente no ambiente de produção, como também no dia a dia das pessoas, desde o levantar até a hora de ir dormir, estejamos vivendo ou não uma pandemia como a da Covid-19.
O uso cada vez mais intenso das tecnologias em associação com os dados para aperfeiçoar ou aperfeiçoar processos está mudando a face da Terra, uma vez que influencia drasticamente o comportamento das pessoas, possibilita o surgimento não apenas de novos modelos de negócio, como de mercado, alterando a economia e as próprias tecnologias, mudando velozmente a sociedade que passa a interagir com as tecnologias para alterá-las seguindo as necessidades da vida.
A pandemia de Covid-19 vai passar e quando as pessoas voltarem a prestar atenção no mundo circulante perceberão que a realidade mudou e muito. Entretanto, o mundo não porque a pandemia de Covid-19 mudou o mundo, mas porque o mundo se transforma a cada novo dia devido à digitalização.
Carlos Magno Corrêa Dias é professor, conselheiro efetivo do Conselho das Mil Cabeças da CNTU, conselheiro sênior do Conselho Paranaense de Cidadania Empresarial (CPCE) do Sistema Fiep, líder/fundador do Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Tecnológico e Científico em Engenharia e na Indústria (GPDTCEI), líder/fundador do Grupo de Pesquisa em Lógica e Filosofia da Ciência (GPLFC), personalidade empreendedora do Estado do Paraná pela Assembleia Legislativa do Estado do Paraná (Alep).