26/10/2010 15:10
A Psicologia e os índios: na busca de respostas, por Sucena Shkrada Resk
Tudo é muito novo. Assim pode ser caracterizada a relação da Psicologia (tradicional) com o universo indígena. A busca de respostas para esse diálogo foi o mote para a publicação da obra disponível em PDF, que trata do tema , lançada neste ano, pelo Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-SP). No livro, são relatadas diferentes iniciativas no estado, entre 2007 e 2009, que tentam encontrar o equilíbrio entre as diferentes culturas.
Como principais recomendações, estão as seguintes diretrizes dispostas na parte final do documento, que reúne relatos tanto de psicólogos, como de liderenças indígenas de diferentes povos:
-O desafio das sociedades nativas é poder manter um contato com a • sociedade nacional sem perder a integridade cultural e étnica. Este desafio deve ser tratado também como premissa ético-política dos psicólogos com as comunidades indígenas, embasando suas práticas e concepções.
-Apoiar as lutas dos povos indígenas, especialmente pelo direito à terra e à • implantação de projetos estruturantes que promovam o desenvolvimento sustentável das aldeias.
-Apoiar a educação indígena diferenciada, expressa pela Constituição Federal, • que garante uma educação bilíngue e a valorização étnica e cultural.
-Promover saúde mental a partir de um enfoque psicossocial, com base • nos determinantes sócio-históricos dos problemas enfrentados hoje pelas diversas comunidades. Superar relações históricas de dominação.
-Fortalecer os laços familiares e comunitários. Intermediar conflitos • e promover vínculos integradores da comunidade, por meio do fortalecimento da identidade étnica e cultural e da legitimação dos conhecimentos tradicionais.
-Inserir a temática indígena nos espaços de debate e formulação de políticas • públicas, como Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Saúde, da Assistência, da Educação. Torná-los presentes na formulação de políticas locais.
-Incentivar a participação de lideranças indígenas nesses espaços e na • relação com pesquisadores.
-Contribuir nas discussões interdisciplinares, especialmente sobre a • natureza dos processos psicossociais e a ética nas relações interculturais.
-Tratar de modo diferenciado cada etnia, em função de sua cultura particular.•
-Tomar cuidado nas pesquisas de campo; princípios éticos devem prevalecer • aos interesses acadêmicos. Garantir as devolutivas dos conhecimentos produzidos às comunidades interessadas
Entre outras.
“…Já existe a psicologia do indígena que é conhecida pelo pajé. Agora, se deve aproveitar a potencialidade de ambas culturas. É importante compreender que a dimensão subjetiva não se expressa das teorias mais importantes da Europa. Ao mesmo tempo, a generalidade servirá para qualquer ser humano, como o exemplo das dinâmicas de grupo adaptadas às circunstâncias locais”, explica o psicólogo Odair Furtado, que assina o pós-.
Na análise da pedagoga Dora Pankararu, os indígenas apreendem ainda hoje o conhecimento da vivência e não do que a Academia busca. “…O mais velho é a estrutura da comunidade. Muitas vezes, os pesquisadores têm pressa a abordá-los e esses (anciãos) pedem que eles venham outro dia e, em algumas ocasiões, também não entendem as perguntas”, explica. São tempos e necessidades diferentes a serem conciliadas, segundo ela.
Em sua avaliação, desde 2007, há um estreitamento das relações entre os psicólogos e indígenas, mas ainda existem questionamentos por parte das comunidades. “Quanto tempo (o psicólogo) vai permanecer? Será que só quer pesquisar? Vai falar o que contei sobre o vizinho?”, diz.
Para Edinaldo Xucurú, estudante de Psicologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), o desafio está em desconstruir bases com conceitos da colonização europeia, para alicerçar trabalhos genuinamente brasileiros. Ele produz hoje um livro voltado à saúde indígena, focado no estado de PE, onde fica a etnia a que pertence. Segundo ele, os pajés ainda hoje são vistos como ‘grandes psicólogos’, entre os povos indígenas, e isso não pode ser desprezado.
Para o pesquisador, no campo da psicologia, existe hoje um tempo de diálogo entre as populações indígenas e brancas, que devem construir uma proposta conjunta.
Ao se constatar ‘esses dois mundos’ da psicologia, se verifica que na última década, surgem demandas na área indígena, por serviços de saúde mental, com o uso de medicamentos psicotrópicos, como também problemas de alcoolismo. Mais um problema em que o campo da psicologia pode contribuir, na visão de algumas comunidades e especialistas, é em relação às que estão em terras demarcadas, pois passaram por processo de perseguição extensa e tiveram de desenvolver outras técnicas de sobrevivência.
O antropólogo Rinaldo Sérgio Vieira Arruda, coordenador do Núcleo de Estudos de Etnologia Indígena, Meio Ambiente e Populações Tradicionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), constata a importância de se reconhecer as (diferentes) formas de sentir o mundo. “Na socialização, se incorpora maneiras emocionais, por meio da cultura, que tem muitos significados. O ser humano não é somente um organismo físico biológico que age automaticamente”, diz.
Segundo o especialista, o ambiente cultural está ligado à história do grupo no qual nascemos. “Mas as culturas nunca estão isoladas…não tem fronteiras. A diferença, entre uma e outra, está na maneira como cada povo incorpora esse conteúdo”, alerta.
A quebra de paradigmas são estratégicas para esse novo olhar, em sua opinião. “Quando as mudanças ocorrem conosco, chamamos de progresso; quando ocorre com os outros, visualizamos como perda”, ilustra para reflexão
Arruda explica que a questão identitária se desenvolve no campo político. “E apesar de ações conservadoras ainda vigentes, o próprio movimento indígena abriu muitos espaços”, avalia.
Mais informações sobre as ações do Grupo de trabalho do CRP-SP sobre a Psicologia e os povos indígenas, podem ser consultadas no site http://www.crp06.org.br/povos/acoes.aspx.
Veja mais, no Blog Cidadãos do Mundo:
19/09/2010 – O pensamento de nova liderança indígena, por Sucena Shkrada Resk – www.twitter.com/SucenaSResk