O evento aconteceu no dia 22 de abril, no Teatro da Aliança Francesa em São Paulo, e foi mediado pelo jornalista Paulo Henrique Amorim.
Participaram da mesa, os professores Raquel Rolnik (Questões Urbanas e Meio Ambiente), Ladislau Dowbor (Conjuntura e Política), Sérgio Haddad (Educação e Cidadania) e Jorge Abrahão de Castro, do IPEA (Economia e Emprego), além de Severine Macedo, Secretária de Juventude do PT, falando sobre Movimentos Sociais e Juventude.
Suas falas foram precedidas de um resgate da história da Caros Amigos pelo diretor, Wagner Nabuco, destacando a figura de Sérgio de Souza, idealizador da revista, falecido há dois anos.
“Muitos previram o nosso fim nos primeiros seis meses e um ano”, falou Wagner. “Mas, 13 anos depois, estamos aqui. Provamos que é possível e necessária uma plataforma de produção de conteúdo que consiga reunir a imensa criatividade, diversidade e talentos de jornalistas, escritores, artistas, pensadores, militantes, sindicalistas, que seja um lugar onde possam convergir os democratas e progressistas. E que há uma demanda por uma cultura de qualidade”.
Mexer no patrimônio para superar desigualdade
Com o tema “Pobreza e Desigualdade”, Jorge Abrahão de Castro, do IPEA, propôs uma análise do Brasil atual a partir de um olhar para o que aconteceu nos últimos tempos. Diversos índices e tabelas referentes aos anos 80, 90 e de 2003 a 2008, revelaram a situação dos quase 200 milhões de brasileiros. A oferta de trabalho desconectada da geração de renda, a alta informalidade em nosso mercado, o avanço do agronegócio combinado com o tanto de terras ociosas em nosso país, foram mostrados pelo economista. “O Brasil não pode se dar ao luxo de deixat tantos milhões de pessoas desempregadas, tantos hectares de terra improdutivos”, disse.
Há uma quebra de paradigma a partir do ano 2000, segundo as tabelas apresentadas. Se em 1990, viviam com até US$ 1,25/dia, 25,6% da nossa população (142 milhões), em 2008, esse índice era de 4,8% ( em 187 milhões). Dentro disso, existem ainda muitas desigualdades regionais e raciais. “O nível de pobreza dos negros é quase o dobro dos brancos”. Entretanto, a desigualdade permanece porque todos ganharam no último período, não está se mexendo no patrimônio. A parte da renda nacional detida pelos mais pobres em relação aos mais ricos continua em proporções escandalosas, na base de 1 X 20, quando na Europa costuma ser 1 X 3, 1 X 4.
Instigado por Paulo Henrique Amorim sobre a impossibilidade de diminuir a desigualdade sem mexer-se nas questões patrimoniais, o representante do IPEA manteve o otimismo. Embora reconheça que com o tamanho da desigualdade no Brasil acabar com ela é bem difícil, Jorge Abrahão acredita que as reformas urgentes e necessárias no Brasil, como a tributária, podem encurtar o caminho.
Emancipação para a juventude
Severine Macedo, presidente da juventude do PT, discorreu sobre a urgência de se trabalhar com os mais de 50 milhões que compõe este segmento. Para a líder, a juventude é um dos segmentos que foi mais atingido pela ausência de Estado do auge neoliberal, onde é tres vezes maior o desemprego, sendo jovens também quem mais mata e morre de forma violenta.
Salientando a necessidade de se ver a diversidade existente nas juventudes brasileiras, Severine, falou e deu dados sobre educação, êxodo rural, cultura, mostrando que “a pobreza tem cor e gênero”. Contou da luta para se “ver o jovem como um ser de direitos” e que precisa de “políticas de emancipação, não de proteção”. Defendeu o aprofundamento das políticas públicas para a juventude, que começaram a partir de 2005, como a conferência nacional, o Pró-Uni, Pró-Jovem, Pontos de Cultura, etc.
Educação está no mercado
“A relação entre desenvolvimento e educação é verdade dada e comprovada”, disse Sergio Haddad, logo no início de sua explanção sobre o tema “Educação, Desenvolvimento e Desigualdade social”. Ver as outras dimensões que tem a educação, não simplesmente como “um aumento de escolaridade para melhorar de emprego”, é um dos desafios herdados no processo do desenvolvimento brasileiro, grande crescimento econômico com manutenção de grande desigualdade. “Não existe democracia na educação se não tem democracia econômica. Renda e escolaridade tem índices semelhantes”.
O nível de escolaridade do brasileiro é baixo e desigual, a média no país é de 7,4 anos de estudo. A qualidade do ensino também é diferenciada para ricos e pobres, existe desigualdade inclusive na escola pública (acesso a recursos, salário dos professores), onde estão cerca de 90% dos estudantes. Segundo o professor ainda existem no Brasil 2,4 milhões de analfabetos de 7 a 14 anos, estando a maior parte no Nordeste (1,36 mi). Haddad mostrou ainda a preocupante situação dos jovens que passaram pela escola e saíram, por meio das políticas de Educação para a juventude (EJA). Só para alfabetização, existe uma demanda de 14 milhões de jovens, e a oferta é de 1.473.000 (10%).
Houveram mudanças grandes nas estratégias em relação ao ensino público, provocou PHA, porque não apresentam resultados significativos? Para Haddad, a educação não tem solução de curto prazo. “Os professores da rede pública hoje fizeram ensino fundamental na escola pública e faculdade privada. É o mercado que está formando esses profissionais da educação, e faltam professores em muitas regiões”.
Terra cada vez mais cara
Uma aula sobre urbanização, nos deu a professora da FAU, Raquel Rolnik. Apresentando “Questões urbanas e meio ambiente” como temas de assuntos cotidianos em São Paulo, ela mostrou como se “condenaram as pessoas à migração” em nosso país, gerando um modelo de crescimento das cidades responsável pela situação atual. Se em 1950, éramos 18 milhões, com 36% nas cidades, passamos em 2005 para uma população urbana de 82%, num total de 169 milhões!!
Raquel Rolnik explicou como a combinação perversa do modelo rodoviarista, a exclusão territorial, o abandono da política do trilho e a construção de grandes avenidas de fundos de vale, permitiram loteamentos nas periferias, regiões onde não havia nada. “O custo da moradia nunca foi incluído no salário mínimo”, disse a arquiteta, “por isso a grande base de miseráveis e pobres não consegue morar no mercado formal, não tem lugar para essa população, que constrói por seus próprios meios”.
Combatendo esse modelo patrimonialista, “onde o acesso à cidade é bloqueado, o imóvel serve para produzir valor, renda e juros”, Rachel afirma que “nosso modelo urbano não é apenas retrato da desigualdade, ele produz mais desigualdade. É obstáculo ao nosso desenvolvimento”. Para ela esse padrão de urbanização excludente e predatório gera uma cidadania ambígua e incompleta dos moradores. Existem em nossas grandes cidades mais domicílios vagos do que déficit habitacional. Em São Paulo, por exemplo, o déficit é de 203 mil e existem vagos 420 mil domicílios. Para a urbanista, o Estado tem instrumentos para controlar isso mas não os utiliza, como os 1.500 planos diretores de cidades realizados. A exclusão é territorial e é política.
Reforma política é prioridade
Com o tema “Conjuntura e reforma política”, coube ao professor Ladislau Dowbor encerrar as exposições. A ausência total de instrumentos de planejamento de governança é o nó da coisa para o professor. “Há um conjunto de soluções absurdas quando se vê sistemicamente”, continuou com seu bom humor característico. Para ele o poder das empreiteiras, do segmento jurídico, a financeirização do voto estão na base da questão. Dowbor defendeu a reforma política, especialmente a questão do financiamento público das campanhas dos partidos, e a reforma tributária como centrais para o desenvolvimento.
“Temos a bancada ruralista, as bancadas da indústria, dos bancos, da mídia, só não temos a bancada do cidadão”,f ala ele sobre o Congresso Nacional. “Não muda o sistema tributário se não mudar a composição do congresso, pois temos propostas técnicas boas, o imposto territorial rural, o imposto sobre grandes fortunas”. O economista acredita que nosso país tem imenso potencial frente às demandas internacionais. “Precisamos evoluir para a sociedade do conhecimento, que será o valor mais importante”. Valor que mais aumenta quanto mais se utiliza.
Por Terezinha Vicente