A solidariedade à professora Ângela

Foto: Valquiria Rosa

Queridas famílias e professoras da Emei Monteiro Lobato
São Paulo, 6 de setembro de 2018

Os últimos dias foram conturbados. Testemunhamos a exposição em vídeo nas redes sociais de uma criança de 4 anos de nossa escola, registrada pelo próprio pai, onde ela responde a suas perguntas sobre algo que supostamente teria acontecido em sala. Seguimos com preocupação a forma como a desconfiança, a intolerância, a falta de escuta e até mesmo o discurso de ódio, atravessaram o cotidiano de nossas vidas e de nossa escola.

Em tempos de comunicação digital, desaprendemos a escutar o outro, não paramos para refletir e temos muito pouca disposição e tempo para o duro trabalho de construção da convivência em espaços coletivos. Estamos num mundo acelerado, onde cada um quer rapidamente emitir um juízo e dizer a sua verdade.
Por isso, se desejamos criar ambientes saudáveis para nós e nossas crianças, temos que ter paciência, tolerância às diferenças, respeito pelo outro e a capacidade de escuta.

Uma boa escola é aquela que acolhe as crianças com todas as suas diferenças. Aprendemos no encontro com o outro, e se desejamos que nossas crianças sejam felizes e que essa geração possa ampliar os horizontes dos sonhos e realizações, não podemos desejar que elas reproduzam um mundo idêntico àquele em que ela vive. Caso contrário, ainda estaríamos vivendo as mesmas opressões das gerações que nos antecederam. Esse é movimento da vida!

Educar significa sempre escolher o que desejamos preservar para as gerações futuras e também escolher o que desejamos transformar e construir como mundo futuro. Por isso, insistimos no importante trabalho de construção coletiva da escola e de sua comunidade (famílias, professoras, gestores, funcionários).

Se nossas crianças relatam algo que nos inquieta precisamos escutá-la com atenção. Devemos procurar a professora, a coordenação pedagógica, a direção da escola, o conselho escolar da escola, e até a supervisão da Diretoria de Ensino. Há um caminho importante a ser percorrido para que possamos esclarecer nossas dúvidas ou anseios, e construir os canais adequados de mediação dos conflitos.

Em nossos tempos, o recurso à mediatização e ampla exposição nas redes sociais de um conflito particular, tem demonstrado ser um caminho inadequado. Podemos avaliar o resultado de nossas ações a partir dos efeitos que elas provocam no mundo. Por acaso as relações entre as famílias da escola ficaram mais solidárias, tranquilas e fraternas? Ou ao contrário, vimos o surgimento de mais desconfiança, intolerância e até gritos de ódio e violência clamando contra a vida do outro?

Neste sentido, insistimos na importância de nossas reuniões presenciais e da participação das famílias, professores e funcionários. Nos encontros do Conselho Escolar podemos conversar e falar escutando e olhando uns aos outros.

As reuniões do Conselho Escolar são abertas a toda a comunidade. Nelas são tratados assuntos dos mais variados: desde decisões administrativas e de gestão de recursos financeiros até aprovação de eventos, passeios e outras propostas pedagógicas.

O Projeto Política Pedagógico (PPP), em respeito às Diretrizes Curriculares Nacionais e à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, inscrita em nossa Constituição, foi também discutido e aprovado no âmbito do Conselho Escolar (em 2017). No PPP de nossa escola, dentre seus objetivos e princípios, consta a promoção e o respeito ao bem comum, à ordem democrática, à liberdade de expressão, o exercício da criticidade, e o compromisso em oferecer às crianças um “ambiente educacional igualitário onde se respeite as diferenças étnico-raciais, de gênero, sócio cultural, de deficiência, transtorno global do desenvolvimento, superdotação e altas habilidades”.

É com base nessa experiência histórica de construção coletiva que desejamos que a escola seja cada vez mais um espaço de aprendizado da vida democrática. Por isso, reforçamos o convite a todas e todos para participar das reuniões do Conselho e se envolverem nos diversos espaços de construção cotidiana de nossa instituição.

Também nos dirigimos às queridas professoras e professores da EMEI Monteiro Lobato. Sabemos do carinho e da dedicação de vocês pela educação de nossas crianças. A liberdade de cátedra e a autonomia no ensino é uma conquista fundamental e um direito garantido pela lei para o pleno exercício da profissão docente.

Essa autonomia que está na base da ação docente é um Comum que devemos sempre cuidar e cultivar, de forma a promover e proteger a saúde coletiva dessa profissão e da instituição escolar. Quando este Comum está sob risco são as próprias condições de trabalho de todos os educadores que se encontram ameaçadas. Por isso, consideramos muito importante o trabalho da empatia, solidariedade e cooperação na equipe docente como parte do cuidado necessário sobre o Comum que constitui essa comunidade.

Reiteramos, por fim, a disposição para o engajamento na construção de uma comunidade escolar solidária, fraterna e amorosa, em respeito aos direitos humanos, aos direitos civis e sociais tão duramente conquistados. Manifestamos nosso apoio e solidariedade à professora Angela e expressamos nosso profundo reconhecimento pela qualidade, dedicação e amor em seu trabalho de docente nesta instituição de ensino.

Que estejamos à altura dos desafios colocados para a construção de um mundo comum e fraterno entre tod@s. As crianças têm o direito de viver em um mundo mais justo, livre e solidário.

Representantes das famílias no Conselho da EMEI Monteiro Lobato

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