27/12/2011
As teias que ligam a COP17 com a Rio+20
As atenções pelo mundo começam a se voltar para a virada do ano e para a retrospectiva sobre os principais acontecimentos de 2011. Diante desse frenesi, comum nesta época, os comentários sobre a 17ª Conferência das Partes (COP 17) da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas começam a ficar escassos. Talvez não estejamos nos dando conta, mas o que foi negociado em Durban, na África do Sul, entre os dias 28 de novembro e 11 de dezembro, com a participação de representantes de 194 países, é um indício dos principais dilemas do que podemos esperar da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), em junho do ano que vem. Isso quer dizer: poucas evoluções efetivas na prática.
Ao lermos o Sumário das decisões tomadas na Conferência, o que se nota é uma série de comprometimentos postergados, sem se alinhavar os termos que nortearão os mesmos. Parece confuso, mas esse realmente é o estado da arte em que vive as relações sob os crivos do Capitalismo. E qualquer ‘acordo vinculante’, para ser implementado, deve ser ratificado por cada um dos países participantes (internamente). Do papel às ações, portanto, há um caminho importante a ser trilhado.
Quanto ao Protocolo de Kyoto (iniciado em 1997), cuja primeira fase expira em 2012, decidiu-se que a segunda etapa prosseguirá a partir de 2013 com término previsto em 2017 ou 2020. Em 2015, deverão ser estruturadas as vinculações dos países (desenvolvidos e em desenvolvimento), mas por enquanto não há um nível consolidado de ambição de redução das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEEs). Canadá já se posicionou oficialmente que não participará e o Japão e a Rússia haviam também anunciado que não integrariam a continuidade.
Na primeira fase, ficou firmado que somente os países do Anexo I (os mais desenvolvidos e mais poluidores) iriam diminuir suas emissões na faixa de 5,2% com relação aos níveis de 1.990; o que não se consolidou. Os EUA, o maior emissor (hoje a China, na categoria de país em desenvolvimento, o ultrapassou), não ratificou até hoje esse acordo e deverá permanecer com essa postura, na segunda etapa. Depois dos dois países, os maiores emissores são Índia, Rússia, Japão e Brasil, na sexta colocação. Então, no sentido da práxis, pouco sabemos, de fato, como essas ações se darão ao longo dos próximos anos. Ainda é uma incógnita.
Retomando o que foi discutido na COP16, em 2010, em Cancún, no México, o que se destacou foi o fato de a maioria das nações concordarem que deveriam tomar medidas para que a temperatura média do planeta não excedesse aos 2 graus em relação aos níveis pré-industriais até o fim do século, com base em dados do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). O grupo de cientistas deverá divulgar seu quinto relatório somente entre 2013 e 2014 (o 4º é de 2007), mas já há cenários que apontam que a temperatura chegará ao aumento na casa dos 4 graus. Entretanto, os países vulneráveis (como os insulares) pleiteavam 1,5º, tendo em vista que já sofrem com o aumento do nível dos oceanos. A COP16, no final, considerou que essa discussão deveria voltar à pauta, entre os períodos de 2013 e 2015. O único país que não aceitou o acordo foi a Bolívia. Enfim, a ciranda aponta que mesmo que todos façam a lição de casa, os patamares serão acima dos dois graus.
Outra pauta que surgiu no ano passado (e não, neste, como muita gente pensa), foi a criação do Fundo Verde do Clima, que estabeleceria a liberação de US 100 bilhões por ano (a partir de 2020), administrado pelas Nações Unidas, com a participação do Banco Mundial como tesoureiro, para o repasse aos países vulneráveis. Na época, foi proposto que deveria ser instituído um conselho administrativo por 40 representantes: 25 de países em desenvolvimento e 15 dos países rico, sem determinar de onde proveriam as verbas. Por parte de países desenvolvidos, foram previstos ainda que liberariam um aporte de US$ 30 bilhões para o período 2010-2012.
Passou o período de um ano, e na COP17, o tema foi retomado, chegando a causar constrangimento, pelo fato de nada de concreto ter ocorrido antes. No documento resultante desta edição, foi estabelecido que o Fundo Verde do Clima terá um conselho e uma personalidade jurídica. Abriu-se a possibilidade de recursos serem provenientes também da iniciativa privada, mas ainda não se sabe de onde realmente virão. Inclusive, se cogita que verbas venham de taxações sobre a aviação.
Um secretariado provisório deverá ser criado até o final de março do ano que vem e a constituição total ocorrer até 15 de abril de 2012. Até a próxima COP18, que será realizada no Dacar, os acordos terão de ser celebrados para apoiar projetos, programas, políticas e outras atividades em países em desenvolvimento para a mitigação (redução) de danos climáticos. Mas enquanto isso?
Em 2010, ainda decidiu-se iniciar a primeira etapa do REED – Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação e do REED+ ( que inclui remuneração de atividades relacionadas à conservação de florestas, ao manejo sustentável e ao aumento dos estoques de carbono florestais em países em desenvolvimento), que é um mecanismo de mitigação voluntário dos países em desenvolvimento, que deverá contar com o apoio técnico e financeiro dos países desenvolvidos, mas pouco se avançou neste ano.
As palavras em torno das COPs ficam sempre no futuro, observaram? Mas os danos decorrentes das mudanças climáticas se encontram no presente. Os refugiados ambientais (termo criado por Lester Brown, do World Watch Intitute, na década de 70) são uma realidade. São obrigados a abandonar temporariamente ou definitivamente a zona onde tradicionalmente viviam.
Segundo o Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), Antonio Guterrez, há um grande risco ao se tratar as mudanças climáticas de maneira isolada, sem relacioná-las ao crescimento populacional, urbanização, escassez de água e aumento da insegurança alimentar e energética. Só em 2010, pelo menos 40 mi pessoas se deslocaram devido a inundações, secas e outros tipos de desastres naturais.
Não podemos esquecer a situação gritante que ocorre no Chifre da África. As motivações se fundem: guerras civis, questões climáticas. São violências travestidas em diferentes formas.
E onde a COP 17 se cruza com a pauta da Rio+20? Em tudo: economia verde, contexto do combate à pobreza e na governança da sustentabilidade. Afinal, todos esses assuntos não estão interligados com o modelo de desenvolvimento que ativa as mudanças climáticas?
Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk – www.twitter.com/SucenaSResk