1ª Marcha a Brasília protesta contra omissão do Congresso

Às 16h30 da terça-feira (18), partiu do Largo do Arouche, região central de São Paulo, um ônibus organizado pelo Fórum Paulista LGBT rumo à primeira I Marcha Nacional LGBT em Brasília. Cerca de 40 pessoas de vários municípios ocuparam o veículo. Dois mil quilômetros estavam à espera dos ativistas paulistas. A APOGLBT contribuiu para a viagem e enviou representantes

Durante os dias 17 e 18, e até na madrugada do dia 19, foram chegando as caravanas de todos os estados do Brasil. Muitas enfrentaram viagens muito longas de ônibus e ainda acamparam em condições básicas no Parque da Cidade.

Desde cedo, no dia 19, representantes de 237 organizações filiadas à Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) estiveram concentrados em frente à Catedral Metropolitana, na Esplanada dos Ministérios. A 1ª Marcha / 1º Grito Contra a Homofobia e pela Cidadania LGBT iniciou com o Hino Nacional, cantado por Jane di Castro, em frente à Catedral Metropolitana de Brasília. Havia cerca de 3 mil pessoas na Marcha.

O grupo protestou pela falta de leis que consagrem a igualdade de direitos, a paralisia na Suprema Corte de várias ações pelos ataques a gays e pelas diferentes formas de violência e intimidação que os cerca de 20 milhões de homossexuais reconhecidos no Brasil sofrem diariamente, segundo a ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais)

No Brasil um homossexual é morto a cada dois dias, segundo dados desta organização, que, além disso, denunciou os ataques sistemáticos e preconceitos contra gays nas escolas, em suas próprias casas e em quase qualquer esfera da sociedade.
A presidente da ONG Visibilidade e do Fórum Paulista LGBT, Phâmela Godoy, deseja que o PL 122 seja aprovado o mais rápido possível, sob pena de os homossexuais continuarem sendo vítimas de discriminação e, em casos mais graves, até de assassinatos. “A não aprovação desta lei significa a negação de 78 direitos a nós garantidos pela Constituição Federal de 1988. Não podemos permitir que isso aconteça”, diz a militante.

Ainda segundo Phâmela, de acordo com números publicados pela imprensa, em 2009, a cada um dia e meio, um homossexual foi morto no Brasil. Neste ano, a situação já se agravou. A cada 24 horas uma pessoa é morta vítima de crime de homofobia, segundo a representante da ONG.

Homofobia institucional

Os manifestantes pararam em frente ao Congresso e vaiaram senadores que se opuseram ao projeto de lei que torna a homofobia um crime. Os alvos foram Gerson Camata (PMDB-ES), Magno Malta (PR-ES) e Marcelo Crivella (PRB-RJ). “Não tenham medo de homossexuais. Vocês não fazem o nosso tipo”, dizia ao microfone um dos manifestantes.

O projeto de lei, que tramita desde 2006, já foi aprovado na Câmara e agora precisa passar pelo crivo dos senadores. Eles colocaram cruzes em frente ao Congresso para lembrar aqueles que foram mortos por causa de sua orientação sexual.

Passaram pelo ato mais de uma dezena de parlamentares. A organização do evento convocou os manifestantes a não votarem em políticos homofóbicos. Também participou a ex-BBB Angélica (Morango), conhecida por assumir a lesbianidade em rede nacional e lutar contra a homofobia e o machismo dentro do programa. Elenita, que também participou do reality show, e marcou sua presença por opiniões fortes e inteligentes, também participou, assim como o jornalista e escritor gay Jean Wyllys, que ganhou o BBB5.

Embaixo de um sol de 35ºC, o deputado federal José Genoino (PT-SP) foi o primeiro a falar no trio. “Não é a primeira vez que estou com vocês, estou sempre com o movimento gay”, disse o deputado. Genoino disse estar lá porque acredita que a sociedade deve “respeitar e aceitar” a união civil, projeto de lei que o deputado defende no Congresso.

Por último e muito aplaudida foi a vez da senadora Fatima Cleide (PT-RO) comparecer. “Se existem as fobias, é porque os Direitos Humanos não estão sendo respeitados” , denunciou a senadora.

Liderança travesti

O destaque, pela liderança que se afirmou na Marcha, ficou por conta das travestis e transexuais, com manifestações de luto pelas companheiras assassinadas. No local de encerramento, em frente ao Congresso Nacional, foram colocadas 198 cruzes simbolizando o número de LGBT assassinados em 2009, segundo levantamento do Grupo Gay da Bahia

Durante a concentração e encerramento, e também em todo o percurso da Marcha, houve a participação e discursos de várias celebridades, representantes de movimentos sociais, movimentos estudantis, associações de classe, e muitos parlamentares, mas em nenhum momento foi pedido voto para qualquer candidato.

Revoltadas com a presença dos humoristas do programa Pânico na TV!, participantes da marcha não deixaram os humoristas gravarem matéria que seria exibida no programa do próximo domingo. “Eles estavam fazendo matéria jocosa. Perguntei para eles se sabiam quantos travestis são assassinados no Brasil e o porquê da realização dessa manifestação em Brasília”, disse a presidenta da Articulação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), Jeovanna Baby.

Lutas e conquistas

As principais reivindicações da Marcha foram:

· Garantia do Estado Laico

· Combate ao Fundamentalismo Religioso.

· Cumprimento do Plano Nacional LGBT na sua totalidade.

· Aprovação imediata do PLC 122/2006

· Judiciário (STF): Decisão Favorável sobre União Estável entre casais homoafetivos, bem como a mudança de nome de pessoas transexuais.

Julian considera que o movimento tem a comemorar a decisão do Itamaraty, anunciado em 17 de maio, de garantir passaporte diplomático e residência para os/as parceiros/as do mesmo sexo de funcionários/as do Itamaraty. Além disso, a Portaria 233/2010 do Ministério do Planejamento que permite o uso do nome social das travestis e transexuais no serviço público federal direto e indireto.

Audiências ministeriais

No mesmo período, audiências foram concedidas à ABGLT por 14 dos 18 ministérios que compõem o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de LGBT. Foi uma oportunidade para averiguar a implementação do Plano, dialogar e pressionar para a plena implementação do mesmo.

Após a Marcha, a presidência da ABGLT também foi recebida em audiência pelo presidente em exercício da Câmara dos Deputados, deputado Marco Maia (PT/RS), acompanhada pela deputada federal Manuela D’Ávila (PCdoB/RS), Paulo Pimenta (PT/RS) e Perpétua Almeida (PCdoB/AC). O principal ponto da pauta da audiência foi o projeto de lei 4914/2009 (união estável entre casais homoafetivos).

Seminário na UnB

Dia Internacional de Luta Contra a Homofobia, celebrado neste 17 de maio, foi marcado por debates no Seminário UnB Fora do Armário, na Reitoria da Universidade de Brasília (UnB). O seminário faz parte da programação da 1ª Marcha Nacional LGBT contra a Homofobia. Pela manhã, houve a apresentação do filme Minha Vida em Cor-de-Rosa. À tarde, o Debate sobre o Plano Nacional LGBT e Marcha LGBT, com a participação do presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) Toni Reis, o coordenador de comunicação da ABGLT Carlos Magno, a 1ª diretora LGBT da União Nacional dos Estudantes (UNE) Ridina Motta, Mitchelle Meira da coordenação–geral LGBT da SEDH/PR e o assessor parlamentar Caio Valadares, que representou a senadora Fátima Cleide (PT-RO).

Toni Reis informou que o presidente Lula se comprometeu com a militância LGBT brasileira de assinar o decreto que cria o Dia Nacional contra a Homofobia, que deve ser assinado nos próximos dias. O presidente da ABGLT também citou a conferência pública sobre o Estatuto da Família, realizada na semana passada, e citou 20 parlamentares homofóbicos e os evangélicos fundamentalistas. “Se não houvesse uma Constituição, eles nos queimariam na fogueira”, disse Toni Reis. Ele frisou que não se trata de todos os cristãos, mas apenas dos fundamentalistas.

Reis destacou também a importância do Programa Nacional dos Direitos Humanos – 3 (PNDH-3). Ele lembrou que as diretrizes traçadas para os homossexuais foram discutidas em várias conferências do movimento social.

Carlos Magno salientou a importância da mobilização dos LGBT para o processo de politização. “Precisamos politizar a nossa sexualidade. Primeiro questionando e constatando que há desigualdade. Precisamos trazer para a arena pública essa nossa forma de amar, do âmbito privado para o âmbito público, para dar essa politização”.
Carlos Magno afirmou que esta politização só pode ser feita a partir do momento em que as pessoas se assumem. “É a questão da visibilidade” , comentou Magno. Os demais membros da mesa expuseram as principais conquistas dos LGBT brasileiros e as principais reivindicações da militância.

Divisor de águas

Na sua fala para a plateia de cerca de 60 pessoas – a maioria composta pelas caravanas de Pernambuco e da Bahia, Toni Reis foi enfático: “A 1ª Marcha Nacional LGBT contra a Homofobia será um divisor de águas da militância brasileira. Já estamos articulando a segunda edição desta manifestação para 2011. Queremos aperfeiçoar esta nossa luta política uma vez que as paradas ganharam o seu poder festivo da diversidade LGBT, mas precisamos de mais mobilização política”, destacou. Os demais membros da mesa também foram unânimes na opinião de que a Marcha Nacional contra a Homofobia será um divisor de águas na militância nacional.

Todos destacaram o empenho de mais de 500 grupos de todo o Brasil que se mobilizaram para chegar aqui em Brasília para a manifestação. “Nosso ato político está na prova de que muitos dos que vão chegar aqui, vêm apenas para a manifestação e voltam assim que ela terminar, no famoso bate-volta. Tem engajamento maior do que esse?”, questiona Reis. Após as palestras, os presentes marcharam rumo ao Instituto Central de Ciências (ICC) da UnB, gritando palavras de ordem contra a homofobia.

Debate na Câmara

No dia 18, houve o VII Seminário LGBT no Congresso Nacional, que lotou o maior auditório da Câmara, o auditório Nereu Ramos. O seminário abriu com o Hino Nacional cantado por Angela Leclery, 61 anos, acompanhada por Keila Simpson, Jovanna Baby e Welluma Brown, num ato de demonstração do exercício da cidadania das travestis.

“Jamais pensei em toda a minha vida que receberia um convite para vir ao Congresso Nacional cantar, ainda mais o hino. Isso é a demonstração de que a nossa luta pelo fim do preconceito tem dado certo”, comemorou Angela. Foi a primeira vez que uma travesti cantou o Hino Nacional na Câmara dos Deputados.

O debate foi muito rico e em vários momentos os participantes se emocionaram com os depoimentos das travestis. Também houve uma exposição sobre o fundamentalismo religioso, proferida pelo advogado e pastor presbiteriano, Marcos Alves da Silva.

Na abertura, Keila Simpson, vice-presidente da ABGLT, emocionou o público do auditório Nereu Ramos ao ler o texto “História de todas nós”, de Rafael Menezes. O texto, de forma poética, embora incisiva, fala do cotidiano das travestis, que enfrentam o preconceito na família, na escola, nas ruas e nos serviços públicos, além da violência que torna o Brasil o país campeão mundial de assassinatos de LGBT, com uma morte registrada a cada dois dias.

A morte mais recente, inclusive, aconteceu exatamente na noite de segunda-feira (17), Dia Internacional de Combate á Homofobia, com o assassinato de uma travesti em Porto Alegre(RS).

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