O futuro da comunicação no Brasil

Enquanto no plenário Juscelino Kubitschek, após uma longa negociação, uma chapa única de delegados do setor empresarial era aprovada por unanimidade, uma intensa e saudável discussão acontecia no auditório Franco Montoro da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo entre representantes de mais de 70 entidades e movimentos sociais para definir quem representaria a sociedade civil paulista na Conferência Nacional de Comunicação. No final, ficou consagrada a unidade na diversidade.

O documento final da etapa paulista contempla o resultado de mais de 60 conferências municipais, intermunicipais e livres, além das propostas aprovadas pelos grupos que debateram três eixos: produção de conteúdo, meios de distribuição e direitos e deveres na comunicação. Surgiram três centenas de propostas. A maior parte delas revela a profunda preocupação da sociedade em relação ao monopólio da mídia, à falta de pluralidade e a forma como a imprensa comercial criminaliza os movimentos sociais.

Para superar esse quadro restritivo da liberdade de expressão, muitas iniciativas são apontadas, desde a cassação pura e simples das concessões públicas até o acompanhamento psicopedagógico da programação de rádio e TV. Algumas são inovadoras: propõem que, em caso de merchandising nas novelas, seja feita a referência de que aquela cena não faz parte do enredo e se trata de publicidade. Detalhe: durante a interpretação. Houve quem também, mais saudosista, pedisse a volta da Embrafilme.

Independente do mérito e da viabilidade das propostas apresentadas, cabe uma ampla e profunda discussão para se saber aonde se quer chegar e quais são os meios para se atingir os objetivos propostos. Do jeito como foi estabelecido o regimento da Confecom, as etapas estaduais ficaram amarradas e não puderam debater e votar propostas; apenas apresentá-las. O resultado foi um documento mais longo e repetitivo. A aprovação final das propostas caberá à conferência nacional.

Diante da impossibilidade de um debate mais intenso sobre os eixos da Confecom, restaram aos delegados da sociedade civil que participaram das etapas estaduais alguns desafios que, necessariamente, deverão ser enfrentados em Brasília. O primeiro deles é a qualificação do debate. Para citar um dos pontos mais levantados pelos movimentos sociais: concentração da mídia. Se o diagnóstico está correto, as propostas são factíveis para alterar esse quadro? Se a Confecom não é deliberativa, como municiar a opinião pública com argumentos que mostrem a importância da comunicação como direito humano e, assim, empurre o governo federal na direção de formar novos consensos em torno das demandas da sociedade civil? Para isto, é fundamental que as propostas estejam baseadas em análises teóricas sobre a realidade, o que implica comparar números, cenários e projeções, considerando com atenção especial os interesses empresariais em jogo.

Para além do resultado desse debate, o que se viu na etapa paulista da Confecom foi um enorme esforço de organização e mobilização da sociedade civil. Na omissão do governo Serra, que preferiu, nas palavras de um parlamentar da base tucana, “empurrar o bode para a Assembléia”, o deputado Edmir Chedid, presidente da Comissão de Transportes e Comunicações, convocou a conferência e garantiu sua realização.

Outra (boa) novidade veio do mundo empresarial. Apesar do afastamento dos principais atores do setor como TV Globo, jornais diários, anunciantes e agências de publicidade, o diálogo entre pequenos e médios empreendedores alinhados com as principais demandas dos movimentos sociais e os representantes das teleoperadoras (Telebrasil) e das TVs Bandeirantes e RedeTV! (ABRA), resultou numa chapa proporcional alinhada com a realidade. Assim, o que se viu em São Paulo foi uma exercício de tolerância e respeito às diferenças. A etapa nacional, que começa nesta segunda (14) em Brasília, dirá o que poderá ser melhor nas comunicações do Brasil daqui para frente.

Marco Piva, jornalista, é delegado à Confecom por São Paulo.