O Muro caiu e deixou sua herança maldita
4ª, 11 de novembro de 2009, por Bruno Lima Rocha
Na segunda-feira dia 09 de novembro cumprem vinte anos da derrubada, a marretadas, do Muro de Berlim, erguido as pressas em 1961. A atual geração de jovens (entre dezoito e vinte e cinco anos) tem pouca ou nenhuma noção desses significados para a política contemporânea. Afirmo isso baseado em minha própria experiência recente na docência universitária, trabalhando também com especialização e pós-graduação acadêmica.
O término da URSS veio após a reação popular ao último suspiro stalinista na forma de golpe militar em agosto 1991. Com o fim da Guerra Fria, a derrota e a dissolução da antiga União Soviética (URSS), concretizada entre agosto e dezembro de 1991, jogaram na vala comum as idéias de igualdade e durante uma década, foi associada a democracia liberal como única forma de regime democrático. A partir da derrota e posterior dissolução da antiga União Soviética culmina um processo onde propositadamente se confunde a plataforma da igualdade com ineficiência econômica e idéias ultrapassadas.
Muita besteira foi dita, como o Fim da História e a irredutível marcha da humanidade rumo à mundialização do capitalismo. Nem tudo foi ou é tão simplista, sendo que a Queda do Muro foi comemorada por vários setores da esquerda, críticos contumazes daquele Estado totalitário.
O senso comum, bombardeado pelas indústrias de bens simbólicos (mídia corporativa) em geral, percebe apenas o efeito da chamada Globalização das Corporações, como a materialização da vitória política, econômica e militar dos EUA e o bloco da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Isto gera uma série de equívocos e déficits na formação daqueles que estão na lida política cotidiana e a cidadania brasileira paga o preço por esta lacuna. O problema se nota em dois exemplos. Um, confundir a política de esquerda essencialmente com a maior intervenção do Estado na economia. Outro relaciona este campo do pensamento apenas com totalitarismo e partido único. Traduzem-se conceitos mal explicados em chavões e rótulos de pouca ou nenhuma profundidade. Apenas para exemplificar o volume das bobagens, tem muito analista político por aí dizendo que “tal político é de esquerda porque defende maior intervenção do Estado na economia capitalista”. Bem, por esse conceito torto, Franklin Delano Roosevelt também seria de “esquerda”.
Estes equívocos são uma parte da herança maldita da Cortina de Ferro. O senso comum associa ao pensamento distributivista e igualitário às características de uma sociedade governada sob ditaduras de inspiração marxista. Esta é uma verdade apenas parcial. Nem todo socialismo é ditatorial e menos ainda marxista. É certo que o marxismo – com todas as suas derivações – foi o pensamento majoritário nas esquerdas. Mas está longe de ser o único. Os embates no interior do campo socialista começam em 1848 e culminam no racha entre federalistas (anarquistas) e centralistas (marxistas) na 1ª Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT, 1864-1871).
Já no século XIX o problema da liberdade e da via estatal dividia águas. E, justiça seja feita, tudo o que aconteceu nas sociedades governadas pela Nomenklatura como classe dominante foi previsto pelos opositores de Marx dentro da AIT. Dito e feito. Ao desdenhar do problema da liberdade e centralizar as decisões em gestores profissionais baseados em uma doutrina com pretensão “científica”, a sociedade passa a ser apenas um objeto de controle e não sujeitos a serem emancipados através da gestão direta no mundo do trabalho, da cultura, da política e do lazer.
Entendo que é urgente resgatar a crítica ao totalitarismo por esquerda para se contrapor a sua falsa alternativa, o pensamento único de base neoliberal. A associação vulgar dissemina a crença de que “concorrência” de mercado é sinônimo de liberdade política. Não é. O primeiro Estado que a ortodoxia neoliberal toma de assalto é o Chile de Pinochet. Os economistas chilenos formados por Milton Friedman, apelidados de Chicago Boys, tornaram real o autoritarismo de mercado.
Em parte o problema continua. O regime ditatorial da China comprova que a ditadura de partido único e controle da sociedade entram em “harmonia” perfeita com as grandes transnacionais. Sua classe dominante, os mandarins do Partido, são dublês de empresários e interdependentes economicamente dos Estados Unidos. Isso pode ser tudo, menos a expressão societária da liberdade política com distribuição de renda e poder.
Está mais do que provado. Uma sociedade justa não pode ser baseada nem na competição e tampouco em nenhuma forma de pensamento único. Vejo dois desafios fundamentais para as esquerdas atuais. Um é aprofundar as formas de democracia social com participação direta nas decisões fundamentais. Outro é livrar-se de vez de toda a herança maldita do extinto Bloco Soviético e suas derivações.
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