A Educação segundo José Serra e a sua Mídia

A campanha que a mídia vem travando contra os professores de São Paulo tem um fundo oligárquico e privatista. Ao agredir a imagem já surrada, por eles mesmos, do professor, a Folha, o Estadão, a Globo, a Veja e diversos outros órgaos empresariais que se dizem de imprensa, têm um objetivo claro: dar passagem à danosa e autoritária política do governo do Estado – doravante chamada de Serra – de desmonte da educação pública, de limitação de recursos salariais e de ataque à classe. Para isto, Serra se utiliza além da “grande mídia”, de outros recursos poderosos, como o da Polícia Militar, sempre violenta. Esta mesma campanha tem se estendido a diversos movimentos sociais, sejam do campo, sejam urbanos. É só questionar as políticas governamentais que você será atacado. Se você disser amém, será elogiado e ganhará espaço nos jornais.

Ao divulgar que uma passeata de no mínimo 50.000 professores que demora cerca de uma hora para passar por uma esquina tem ora 3.000, ora 5.000 manifestantes, há uma intenção clara de abafar algo que tem crescido nas últimas semanas: a insatisfação do professor com as suas condições de trabalho, com as toneladas de medidas tomadas de cima para baixo e, como não poderia deixar de ser, com os péssimos salários. Mais ainda, esta manipulação de dados oficiais procura demonstrar uma fraqueza que não existe, como observado por todos que passaram na tarde de ontem entre a Avenida Paulista e a Praça da República, inclusive pelo helicóptero da PM que a toda hora sobrevoava a Rua da Consolação e que deve ter a melhores imagens da passeata. Infelizmente, corremos o risco de nunca vermos ou apenas vermos trechos selecionados destas imagens. Mas consegui filmar um pouquinho, vejam, é só clicar: http://br.youtube.com/watch?v=s6fYkA3sGOA

Ao contrário do que opina o Editorial de uma das grandes empresas de comunicação, as causas desta manifestação – que continuará acontecendo até haja um diálogo – não são pretextos. O porta-voz da Folha para assuntos educacionais, Gilberto Dimenstein, usa e abusa do seu conforto para desmerecer o professorado. Primeiro, temos que nos perguntar se ter bons professores, com boas condições de trabalho, como reduzido número de alunos por sala, tempo de pesquisa e estudo, trabalhos pedagógicos aprofundados, acesso à informação e recursos materiais é importante. Caso sim e estas condições de formação e trabalho sejam fornecidas pelo estado – uma obrigação constitucional – devemos partir para o segundo ponto: gestão democrática.

Temos que nos perguntar se os professores, como formadores de cabeças pensantes da sociedade, são capazes de decidir sobre os seus métodos de trabalho e sobre as decisões políticas para a classe. Com condições e liberdade de escolha, devemos agora pensar no terceiro ponto: condições salariais. Temos que nos perguntar se o professor ganha o suficiente para ter o básico de uma vida saudável e feliz: casa, comida, vestimentas, transporte, estudo e lazer. Com estes três níveis de condições verdadeiros, estaríamos todos nós, educadores de coração, atuando, formando, produzindo e libertando. Mas não é nada disto o que acontece. Para piorar, as condições de vida da grande maioria das famílias dos estudantes, que vivem no desemprego formal ou informal e em precárias condições de vida no campo e na cidade, contribuem para que a situação na sala-de-aula se agrave.

Agora, me responda: a culpa é do professor? Escolas velhas (em todos os sentidos), 45 alunos por sala (quem já deu aula para uma 5a. Série com mais de 30 alunos sabe do que estou falando), nenhum tempo para estudar e preparar aulas e fazer cursos de qualidade (não aqueles que suspeitos cursos manipuladores que a secretaria do estado fornece), pouco tempo para discussão pedagógica de fato e poucos recursos para trabalhar tranquilamente, como tirar cópias de textos e avaliações escritas. Políticas educacionais pensadas por poucos, autoritariamente empurradas para a sala-de-aula, e escolha de diretores por processos centralizados e antidemocráticos. Processo de atribuição de aulas interrompida anualmente, longo e desmotivador. A culpa é do professor?

E por último, salários muito, muito baixos. Vocês sabem quanto ganha um professor de 1a. a 4a. séries (PEB I) da rede pública estadual. Seu salário base é de R$ 700,09 para trabalhar 30 horas semanais. O professor que educa de 5a. Série até o Ensino Médio (PEB II) ganha mais: R$ 810,45 como base salarial para as mesmas 30 horas. Ser diretor, então, é um cargo privilegiadíssimo, ele consegue tirar R$ 1.490,26 por uma jornada de 40 horas semanais! Pensem e avaliem nestas condições salariais. Pense nas condições de vida de um profissional que precisa de estabilidade, equilíbrio e de tempo para estudar. Mas se eu quiser ganha mais, tudo bem, vou trabalhar mais, afinal, professor é vagabundo não? Tem professores que acumulam cargos que chegam a trabalhar mais de 60 horas por semana! A culpa é do professor?

Se pensarmos que a semana tem 168 horas e destas, deveríamos dormir em média 60 horas, sobram apenas 48 horas para fazermos as outras coisas da vida. Contando que destas 48 horas, 32 ficam reservadas para o fim-de-semana, teremos 16 horas por semana para estudar, cozinhar, lavar, brincar e cuidar dos filhos e familiares, entre outras atividades de lazer. São 2 horas por dia para cuidar da casa e para lazer. Não é à toa que muitos professores faltam, muitos tiram licença médica e muitos estão ficando invalidados para a profissão, perdendo voz e tendo problemas ósteo-articulares musculares. A tensão não é apenas física, a pressão psicológica tem levado muitos professores a procurar apoio psicológico e psiquiátrico. Não bastasse isto, a Lei 1041/08 quer impedir que o professor fique doente por mais de 6 dias. Mais do que isto, não pode, é para descontar do salário… A culpa é do professor?

Pois é, mas não pára por aí. No fim de maio dste ano, foi publicado o Decreto 53037/08, que na prática, coloca diversas limitações para os professores utilizarem o Artigo 22 da Lei 444/85, aquele que rege a transferência entre escolas, incluindo entre regiões no estado de São Paulo. Na vida instável do professorado, este artigo tem sido essencial na busca de um local de trabalho cada vez mais próximo de sua cidade de origem ou por prefererência, seja por questões familiares ou não. O envolvimento com a sua comunidade num lugar escolhido por ti é algo que faz a diferença numa verdadeira educação. Com este decreto, também, diversos ACTs (professores Admitidos em Caráter Temporário) correm o risco de serem demitidos ao fim do ano, com a instauração de um processo seletivo que não leva em conta o tempo de trabalho. Assim, professores que estão a 30 anos no ofício, próximos de se aposentar, podem ser despedidos, assim, de uma canetada só… Tudo isto sem qualquer consulta à classe ou às entidades que a representam. Pois é, acho que a culpa não é do professor.

Estes são os “pretextos” que a Folha e outras empresas de comunicação colocam. A fala da secretária de educação Maria Helena Guimarães de Castro, sempre é respaldada por este “jornalismo”, com o argumento de que professores tem condições de trabalho adequadas e que a qualidade do ensino só está assim por causa dos professores que não têm vontade de ensinar, fingem que estã doentes e veja só, querem voltar para as suas cidades. Pior ainda, querem ser concursados…Serra e o seu partido de lógica privatista têm uma orientação clara: precarizar o ensino público, buscando aos poucos colocar a educação como item secundário na vida da população e do trabalhador. Assim, com professores infelizes e ensino comprometido, a população carecerá cada vez mais de condições de reflexão e de ação para impedir este solene avanço do capital. Alguém já diria: o governo quer a população ignorante mesmo.

Por isto, nós professores, pedimos o apoio de outros professores, pais, estudantes e imprensa livre para que nos defendam destes ataques ideológicos do governo de São Paulo e da imprensa serrista. Exigimos ainda que a secretária de educação divulgue os verdadeiros dados sobre o tamanho da greve, que segundo ela teve adesão de apenas 2%. Só ontem no vão do MASP, tínhamos no mínimo 20% de todo os professores do estado, num mesmo lugar e ao mesmo tempo. E pedimos também (tudo bem, eu sei que é demais) para que a Polícia Militar divulgue os verdadeiros dados sobre as manifestações. Neste caso, eu até entenderia se o Serra desse um cursinho pré-manifestação para ensinar o seu braço repressor a contar de 1 a 100.000. Esperem e verão. Até semana que vem.

André Murtinho Ribeiro Chaves

Professor de Ciências – Cananéia – SP

Coletivo Educador do Lagamar

One thought on “A Educação segundo José Serra e a sua Mídia

  1. A Educação segundo José Serra e a sua Mídia
    Professor estamos vivenciando esse mesmo processo em Minas Gerais, que está copiando o modelo implantado em São Paulo, projeto empurrados de cima para baixo, autonomia escolar que não existe, fala-se em criar um bônus aqui também e assim não sai aumento salarial, e o nosso salário atualmente é de 500,48 para o professor do Ensino Fundamental (5ª a 8ª série) e de 610,59 para o Ensino Médio e ainda sou obrigada a ver o tempo todo na mídia que a educação em “Minas Avança”, que é a melhor do Brasil. Obrigada por se manifestar a mosso favor, é urgente que uma conscientização cada vez maior dos professores.

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