BBB, cidadania e papoulas

Em sua oitava edição, mais um Big Brother Brasil chega à tela. O enlatado, apesar de não atingir recordes de audiência, continua a manter alguns brasileiros em frente a TV. E a emissora, sedenta por lucros, começa a modificar algumas regras do reality show, com o intuito de reconquistar os telespectadores, acostumados ao programa desde sua primeira exibição em 2002, no qual o lendário “Bam bam” abocanhou o prêmio de um milhão de reais.

Seguindo quase um roteiro de novela das nove (plim! plim!), inicia-se a trama da seguinte maneira, primeiramente ocorre todo o jogo da conquista, em que um dos belos participantes (escolhidos a dedos) será disputado ou pelas belas moçoilas ou pelos belos moçoilos, formando na maioria das vezes um triângulo amoroso. Logo após, intensificam-se as cenas de sexo (porém sempre adequadas à idade e ao horário, tudo de acordo com a lei), para depois se formarem as famosas “panelinhas”, nas quais as intrigas (ou fofocas) passam a comandar a “casa mais famosa do Brasil”, segundo as palavras de Pedro Bial.

Assim, como numa receita seguida à risca, a audiência volta a subir e os diretores ficam mais tranqüilos, visto que as votações para eliminar os participantes atingem números impressionantes, garantindo os patrocinadores do enlatado. Todavia, o que mais chama a atenção é que o país pára as terças-feiras à noite para acompanhar a “eliminação do BBB”, como se a eleição de quem fica e quem sai da casa resguardasse a máxima expressão democrática e política aos brasileiros. E este movimento cultivado pelos programas de massa, inculca, por sua vez, uma pseudo-liberdade de escolha nos sujeitos, na qual se supõe que seja o público responsável por decidir o destino da cada participante.

Diante desta situação, percebe-se portanto, a partir da perspectiva sartriana, que ocorre uma des-humanização do homem, pois lhe é privado a escolha, sua característica peculiar. Por isso, faz-se necessário questionar, não somente a alienação e o desrespeito para com o telespectador, ou ainda a inescrupulosidade dos meios de comunicação e a homogeneização promovida pela indústria cultural; mas também a humanização dos meios de comunicação, que devem conferir ao público o acesso a uma programação respeitosa e distante da antiga política romana: pão e circo.

Vale relembrar que, há poucos anos o Brasil vivia um dos seus períodos mais tenebrosos, a ditadura militar. Durante o regime, a liberdade de expressão dos civis foi censurada. Os meios de comunicação assumiram um papel estatal, esquivando-se de sua responsabilidade social. O medo se tornou um elemento urbano e também companhia dos jovens, que por vezes saíam sem a certeza da volta para casa. Foram dias de escuridão, os quais chegaram aos limites do recalque, da des-humanização.

Hoje, passados pouco mais de 20 anos, encontramos uma juventude pós-regime militar, pós-70. Uma juventude filha da revolução, das Diretas Já! Uma juventude sem censura, longe da Moral e Cívica e OSPB. Uma juventude livre, mas que assiste passivamente a programação global em companhia de seus pais, que outrora lutaram por dias melhores.

Neste encontro, pais e filhos diante do BBB-8 exercem sua cidadania high tech, debatendo e votando em quem deve continuar na casa. Pensando, por que não um dia lá estar? Afinal, pode-se ser famoso e cobrar um alto cachê para, por exemplo, ser o garoto propaganda de algum produto. E que pai não ficaria feliz e orgulhoso em ver seu filho, um ex-BBB, como apresentador de TV ou na capa de uma revista exibindo o tão sonhado nu artístico? Porém, o futuro pode ser ainda mais promissor caso se tenha além de uma enorme bunda, um rostinho bonito e aceitação nacional. Com esses atributos, um ex-BBB pode vir a ser jornalista e fazer matérias deploráveis, ou quem sabe uma atriz na novela das nove, ou também fazer uma “ponta” junto a Rainha dos Baixinhos (alguém ainda reconhece esse título a Xuxa?) Enfim, há um leque de oportunidades para um ex-BBB que, diferentemente da maioria da população, não estará desempregado.

Frente a este contexto caótico, no qual valores éticos foram descartados, torna-se emergente a humanização da televisão. Repensar nossas condutas, a fim de compreender que o indivíduo deve ser capaz de impor a si seus próprios valores, assumindo por conseqüência, a responsabilidade de seus atos, pode ser uma alternativa para que as instituições televisivas cumpram verdadeiramente seu papel social, enquanto concessões públicas formadoras de opiniões. Caso esta situação se prolongue e os paradigmas atuais da indústria cultural de massa não se modifiquem, apenas nos restará recorrer a Marx, adaptando-o aos tempos modernos: “A televisão é o ópio do povo”.

Patrícia Carvalho
Estudante de Psicologia – PUC Minas

http://ealemdisso.blogspot.com

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