Sociedade civil se mobiliza por outra Reforma Política

Out/2006

Ana Claudia Teixeira e Michelle Prazeres*

A reforma política, em que pese os distintos momentos de sobes e desces do debate no Congresso, Governo Federal e mídia, tem um marco comum: a ênfase – quando não a redução exclusiva do debate – numa reforma da legislação eleitoral e dos partidos.

A construção de uma sociedade democrática, no entanto, está inserida em um contexto mais amplo, que diz respeito a mudanças no próprio sistema político, na cultura política e no próprio Estado. As constatações de que os objetivos da Carta Constitucional não têm sido alcançados plenamente e de que seus avanços caminham a passos curtos se convertem em incentivos à mobilização a fim de aprimorar as regras do sistema político.

É para reivindicar esta “outra reforma” que movimentos sociais, redes, fóruns e ONGs – à frente delas o Fórum Nacional de Participação Popular – vêm construindo, desde 2005, uma proposta de Reforma Política para o Brasil. Esse documento, denominado por nós de Plataforma, exige uma reforma ampla que expanda a democracia em cinco diferentes eixos: I. Fortalecimento da democracia direta, II. Fortalecimento da democracia participativa, III. Aprimoramento da democracia representativa: sistema eleitoral e partidos políticos, IV. Democratização da informação e da comunicação e IV. Transparência no poder judiciário.

Em relação à democracia direta, é imprescindível a definição de uma nova regulamentação das formas de manifestação da soberania popular expressas na Constituição Federal (plebiscito, referendo e iniciativa popular). A atual não só restringe a participação, como a dificulta. A ampliação das regras sobre plebiscito e referendo é necessária para que a participação popular nas decisões políticas seja efetiva e não meramente simbólica.

Os inúmeros espaços de participação, em especial os Conselhos de políticas e as Conferências não dialogam entre si e muito menos tencionam o atual sistema político representativo. A participação popular nesses espaços é majoritariamente uma participação consultiva, setorializada, reproduzindo a fragmentação existente nas políticas públicas e o distanciamento das decisões econômicas referente à alocação de recursos públicos. Para o aperfeiçoamento da democracia participativa, acreditamos ser necessário construir um sistema integrado de participação popular.

Apesar de defendermos que a reforma política diz respeito não somente aos processos eleitorais ou aos partidos, mas sim a todos os processos decisórios, portanto, de poder, entendemos como necessário o aperfeiçoamento da democracia representativa, que implica mudanças no sistema eleitoral e partidário.

É preciso afirmar também que sociedade e comunicação democráticas são indissociáveis. Pertencem ao mesmo universo e sua relação não pode ser dissolvida. Se a comunicação exerce um papel fundamental para a realização plena da cidadania e da democracia brasileira, a democratização da comunicação representa condição fundamental para o efetivo exercício da soberania popular.

O Poder Judiciário é o poder que a população tem mais dificuldades em acessar. Os profissionais do Poder Judiciário são concursados ou exercem cargos de confiança. Não estão sujeitos a nenhum tipo de controle social ou participação da população, Por isso, precisamos construir mecanismos de participação e controle social sobre o Poder Judiciário, para que cumpra o papel regulador das relações sociais, econômicas e políticas.

Também é foco dessa plataforma o respeito às diversidades, garantindo voz e poder político a grandes parcelas da sociedade brasileira que sempre foram excluídas pela desigualdade econômica e social, pela violência e pela mídia conservadora e reprodutora do sistema opressor de excludente, a exemplo de negros(as), mulheres e povos indígenas.

Enfim, sem negar a necessidade de um Estado eficiente na defesa do interesse público e com ampla participação popular, essa plataforma se opõe necessariamente ao paradigma do Estado mínimo. Opõe-se também a uma forma tradicional de fazer política, baseada no patriarcado, patrimonialismo, personalismo, nepotismo e clientelismo, na medida em que propõe uma reforma política que radicalize a democracia, que enfrente as desigualdades e a exclusão, que promova a diversidade e a participação cidadã. Uma reforma que amplie as possibilidades de setores excluídos do poder, como as mulheres, os/as afrodescendentes, os/as homossexuais, os/as indígenas, os/as jovens, as pessoas com deficiência, os/as idosos; enfim, de todos/as os/as despossuídos/as de direitos.

A Plataforma para uma Reforma Política para o Brasil, com os cinco eixos de ação, está circulando o país em seminários e encontros regionais para ampla consulta e debate nacional em redes, fóruns, movimentos sociais, populares e sindicais. Sua versão completa se encontra na página www.participacaopopular.org.br

A intenção é de que os resultados deste ciclo de debates sejam consolidados em um importante instrumento de pressão sobre o novo Congresso Nacional e o poder Executivo Federal para que os itens dessa plataforma sejam considerados num processo de reforma política que responda de fato ao interesse público.


Ana Claudia Chaves Teixeira é coordenadora de participação cidadã do Instituto Pólis e membro da coordenação do Fórum Nacional de Participação Popular – FNPP.

Michelle Prazeres é jornalista e integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e do FNPP.

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